Recomendação 105 (CNJ)/2021

Recomendação 105 (CNJ)/2021

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23/08/2021

DE CNJ,n. 218, p. 2-4.Data de disponibilização: 28/08/2021. Data de publicação: 1º dia útil seguinte ao da disponibilização no Diário eletrônico (Lei 11419/2006)

Dispõe sobre a necessidade de se conferir prioridade à apreciação das hipóteses de descumprimento de medidas protetivas de urgência e à atuação em rede, com o Ministério Público e os órgãos integrantes da Segurança Pública, para se conferir maior efetividade às medidas protetivas de...
Ementa

Dispõe sobre a necessidade de se conferir prioridade  à  apreciação  das  hipóteses  de descumprimento  de  medidas  protetivas de  urgência  e  à  atuação  em  rede,  com  o Ministério Público e os órgãos integrantes da Segurança Pública, para se conferir maior efetividade às medidas protetivas de urgência, e dá outras providências.

RECOMENDAÇÃO Nº 105, DE 23 DE AGOSTO DE 2021. Dispõe sobre a necessidade de se conferir prioridade à apreciação das hipóteses de descumprimento de medidas protetivas de urgência e à atuação em rede, com o Ministério Público e os órgãos integrantes da Segurança Pública, para...
Texto integral

RECOMENDAÇÃO Nº 105, DE 23 DE AGOSTO DE 2021.

 

  

Dispõe sobre a necessidade de se conferir prioridade  à  apreciação  das  hipóteses  de descumprimento  de  medidas  protetivas de  urgência  e  à  atuação  em  rede,  com  o Ministério Público e os órgãos integrantes da Segurança Pública, para se conferir maior efetividade às medidas protetivas de urgência, e dá outras providências.

  

  

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), no uso de suas atribuições legais e regimentais,

CONSIDERANDO  o  poder  normativo  constitucionalmente  deferido  ao Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B, § 4o, inciso I, da CF);

CONSIDERANDO que é dever do Estado criar mecanismos para coibir a violência doméstica (art. 226, § 8o, CF);

CONSIDERANDO  que  a  eliminação  da  violência  doméstica  e  familiar contra mulheres e meninas em situação de vulnerabilidade é condição indispensável para o seu desenvolvimento afetivo, psíquico, intelectual e laboral, bem como de seus filhos;

CONSIDERANDO o inaceitável aumento do número de feminicídios no Brasil, bem como das diversas modalidades de violência contra mulheres e meninas em situação de vulnerabilidade no ambiente doméstico e familiar;

CONSIDERANDO que a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará), promulgada pelo  Decreto  no  1.973/1996,  determina  aos  Estados  Partes  que  incorporem  na  sua  legislação  interna  normas  penais,  processuais  e  administrativas  para  prevenir,  punir  e erradicar a violência contra a mulher, bem como que adotem as medidas administrativas e jurídicas necessárias para impedir que o agressor persiga, intimide, ameace ou coloque em perigo a vida ou integridade da mulher, ou danifique seus bens (art. 7o, c e d);

CONSIDERANDO  que  a  Recomendação  Geral  no  35  do  Comitê  para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) orienta os Estados  Partes  a  adotar  e  implementar  medidas  efetivas  para  proteger  e  assistir mulheres autoras e testemunhas de denúncias relacionadas à violência de gênero, antes, durante  e  após  o  processo  legal, o que inclui o fornecimento  de  mecanismos  de proteção  apropriados  e  acessíveis  para  prevenir  a  violência  futura  ou  em  potencial  (item 31, alínea a.ii);

CONSIDERANDO a necessidade de se desenvolverem políticas públicas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda  forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 3o, § 1o, da Lei no 11.340/2006);

CONSIDERANDO a possibilidade de decretação da prisão preventiva do agressor,  se  o  crime  envolver  violência  doméstica  e  familiar  contra  a  mulher, criança, adolescente,  idoso,  enfermo  ou  pessoa  com  deficiência,  para  garantir  a  execução  das medidas protetivas de urgência (art. 313, III, Código de Processo Penal);  

CONSIDERANDO  que  constitui  crime,  previsto  no  art.  24-A  da  Lei  no 11.340/2006,  o  descumprimento  de  decisão  judicial  que  defere  medidas  protetivas  de urgência previstas na referida lei;

CONSIDERANDO  a  necessidade  de  se  conferir  plena  efetividade  às normas penais e processuais penais e, notadamente, às medidas protetivas de urgência;

CONSIDERANDO a necessidade de se conferir prioridade à  apreciação judicial das hipóteses de descumprimento de medidas protetivas de urgência, no intuito de se evitar a escalada e a intensificação da violência, e de se prevenirem feminicídios;

CONSIDERANDO  que a  política  pública  que  visa  coibir  a  violência doméstica  e  familiar  contra  a  mulher  far-se-á  por  meio  de  um  conjunto  articulado  de ações  da  União,  dos  Estados,  do  Distrito  Federal  e  dos  Municípios  e  de  ações  não-governamentais, tendo por diretriz a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério  Público  e  da  Defensoria  Pública  com  as  áreas  de  segurança  pública, assistência  social,  saúde,  educação,  trabalho  e  habitação (art. 8o, I, a, da Lei no 11.340/2006);

CONSIDERANDO que a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher - Convenção de Belém do Pará, promulgada pelo Decreto no 1.973/1996, determina aos Estados Partes que promovam a educação e treinamento de todo o pessoal judiciário e demais funcionários responsáveis pela aplicação da  lei,  bem  como  do  pessoal  encarregado  da  implementação  de  políticas  de  prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher (art. 8o, c);

CONSIDERANDO que a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher - Convenção de Belém do Pará preconiza que os  Estados  Partes  adotem  programas  destinados  a  promover  o  conhecimento  e  a observância do direito da mulher a uma vida livre de violência e o direito da mulher a que se respeitem e protejam seus direitos humanos, bem como modificar os padrões sociais e culturais de conduta de homens e mulheres, inclusive a formulação de programas formais e  não  formais  adequados  a  todos  os  níveis  do  processo  educacional,  a  fim  de  combater preconceitos e costumes e todas as outras práticas baseadas na premissa da inferioridade ou superioridade de qualquer dos gêneros ou nos papéis estereotipados para o homem e a mulher, que legitimem ou exacerbem a violência contra a mulher (art. 8o, a e b);

CONSIDERANDO  que  a  Recomendação  Geral  no  35  do  Comitê  para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) orienta os Estados Partes a fornecerem capacitação, educação e treinamento obrigatórios, recorrentes  e  efetivos  para  membros  do  Judiciário,  para  capacitá-los  a  adequadamente prevenir e enfrentar a violência de gênero contra as mulheres (item 30, alínea e);

CONSIDERANDO que, de acordo com a Recomendação Geral no 35 do Comitê para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW),  a capacitação  deve  promover  a  compreensão  de    como  os  estereótipos  e preconceitos  de  gênero  levam  à violência  de  gênero  contra  as  mulheres  e  a  respostas inadequadas  a  ela;  do  trauma  e  de  suas  consequências;  da  dinâmica  de  poder  que caracteriza a violência do parceiro; das diferentes situações em que as mulheres enfrentam diversas  formas  de  violência  de  gênero,  e  das  formas  adequadas  de  interagir  com  as mulheres e de eliminar fatores que levem à  revitimização e ao  enfraquecimento de sua confiança nas instituições e nos agentes do Estado (item 30, alínea e);

CONSIDERANDO  que  a  Resolução  CNJ  no  254/2018,  que  institui  a Política Judiciária Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres pelo Poder Judiciário,  estabelece  que  um  dos  seus  objetivos  é  fomentar  a  política  de  capacitação permanente de servidores em temas relacionados às questões de gênero e de raça ou etnia

(art. 2o, VI);

CONSIDERANDO  a  necessidade  de  atuação  sinérgica  do  Conselho Nacional  de  Justiça  e  do  Conselho  Nacional  do  Ministério  Público,  que  também  tem enfatizado em atos normativos a imprescindibilidade de se conferir maior efetividade às medidas protetivas de urgência para o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher;  

CONSIDERANDO a decisão proferida pelo Plenário do Conselho Nacional  de  Justiça  no  julgamento  do  Procedimento  de  Ato  Normativo  no  0006189-86.2021.2.00.0000, na 336ª Sessão Ordinária, realizada em 17 de agosto de 2021;

  

RESOLVE:

  

Art. 1o Recomendar a todos(as) os(as) magistrados(as) que atuem em Varas  do  Júri  e  em  Juizados  e  Varas  que  detenham  competência  para  aplicar  a  Lei  no 11.340/2006 que priorizem:

I  -  a  apreciação,  no  prazo  máximo  de  48  (quarenta  e  oito)  horas,  das hipóteses de descumprimento de medida protetiva de urgência, para os fins, se for o caso, de  decretação  da  prisão  preventiva  do  agressor  para  garantia  da  execução  das  medidas protetivas de urgência (art. 313, III, Código de Processo Penal);  

II - a tramitação e o julgamento céleres de processos relativos ao crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência (art. 24-A da Lei no 11.340/2006); e III - a imposição de monitoramento eletrônico ao agressor, nas hipóteses em  que,  identificado  risco  de  novo  ato  de  violência  doméstica  e  familiar,  ainda  não justifique a decretação da prisão preventiva.

 

Art. 2o Para a consecução dos fins previstos no artigo anterior, os órgãos do Poder Judiciário deverão, preservadas a imparcialidade e  a independência funcional do(a)  magistrado(a),  promover  a  integração  operacional  com  o  Ministério  Público,  a Defensoria Pública e as áreas de segurança pública, de modo a viabilizar:

I - o acesso imediato aos respectivos autos pelos sujeitos processuais;  

II - a celeridade de suas respectivas manifestações;  

III - o necessário preenchimento do Formulário Nacional de Avaliação de Risco  de  que  trata  a  Resolução  Conjunta  CNJ/CNMP  no  5/2019,  para  subsidiar  a apreciação judicial de pedidos de medida protetiva de urgência e/ou cautelar, e, em último caso, a decretação da prisão preventiva;

IV - a célere expedição e inclusão dos mandados de prisão no BNMP, com seu imediato encaminhamento físico às autoridades policiais e seus agentes, nos casos de maior urgência, para cumprimento.

 

Art. 3o Recomendar aos Tribunais de Justiça e aos(às) magistrados(as) de Direito, nas hipóteses de expedição de mandados de prisão, alvarás de soltura e de seus respectivos cumprimentos, bem como de fuga do investigado ou réu preso, nos casos de  crimes praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, que a vítima  seja  imediatamente  cientificada  desses  eventos  mediante  contato  telefônico  ou mensagem de texto via Whatsapp ou outro aplicativo similar, certificando-se nos autos.

Parágrafo único. Idêntica providência deverá ser adotada nas hipóteses de decretação ou de indeferimento de prisão preventiva ou medidas protetivas de urgência.

 

Art.  4o  Recomendar  aos  Tribunais  de  Justiça  que  promovam,  no  prazo máximo de 120 (cento e vinte) dias, a capacitação em direitos fundamentais, desde uma perspectiva de gênero, dos(as) servidores(as), incluindo-se oficiais de justiça, em exercício  em  Juizados  ou  Varas  que  detenham  competência  para  aplicar  a  Lei  no 11.340/2006, neles compreendidas as Varas Criminais, do Júri e de Família.

Parágrafo único. A capacitação de que trata o caput deverá, dentre outros objetivos, possibilitar  a compreensão do ciclo da  violência e dos fatores de risco a que estão  submetidas  as  mulheres  em  situação  de  violência  doméstica  e  familiar;  dos estereótipos  e  preconceitos  que  levam  à  violência  de  gênero;  do  trauma  e  de  suas consequências; da dinâmica de poder que caracteriza a violência de gênero, e das formas adequadas de interagir com as mulheres e de eliminar fatores que levem à revitimização e ao enfraquecimento de sua confiança nas instituições e nos agentes do Estado.

 

Art. 5o Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.

  

Ministro LUIZ FUX

 

Este texto não substitui a publicação oficial.

 

BIBJF3R