Nota Técnica 25 (CIn)/2019

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31/05/2019

Nota Técnica 25/2019 Brasília, 31 de maio de 2019. Assunto: Tema com repercussão geral rejeitada em que há declaração de inconstitucionalidade reconhecida por tribunal de segunda instância. Relator: Marcelo Ornellas Marchiori (STJ) Revisor: Taís Schilling Ferraz (TRF4) e Carlos Alberto Gonçalves...
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Nota Técnica 25/2019

 

Brasília, 31 de maio de 2019.

 

Assunto: Tema com repercussão geral rejeitada em que há declaração de inconstitucionalidade reconhecida por tribunal de segunda instância.

 

Relator: Marcelo Ornellas Marchiori (STJ)

 

Revisor: Taís Schilling Ferraz (TRF4) e Carlos Alberto Gonçalves (STF) -

1 RELATÓRIO

 

É possível identificar numerosos processos em tramitação nas cinco regiões do País e no Superior Tribunal de Justiça, cuja controvérsia jurídica é relativa à aplicação ou não do fator previdenciário no cálculo do salário de benefício da aposentadoria por tempo de contribuição de professor, nas hipóteses em que o segurado reuniu os requisitos para

aposentação após a Lei n. 9.876/1999.

Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário n. 1.029.608 (Tema 960), rejeitou a repercussão geral da matéria por entender que a discussão está circunscrita ao âmbito infraconstitucional. Eis a ementa do julgado (acórdão publicado no DJe de 31/8/2017)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DE PROFESSOR. FATOR PREVIDENCIÁRIO.

INCIDÊNCIA. PRECEDENTES. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

O reconhecimento da ausência de repercussão geral ante a identificação de que a matéria é de cunho infraconstitucional se apresenta como uma importante diretriz institucional de atuação dos demais tribunais, em especial do Superior Tribunal de Justiça. Isso porque uma das principais consequências desse ato da Suprema Corte diz respeito a qual Corte cabe o julgamento final da questão jurídica: tribunais de segunda instância, quando se tratar de ofensa à legislação estadual ou municipal (Súmula n. 280/STF); ou Superior Tribunal de Justiça, caso a eventual violação seja à legislação infraconstitucional federal.

No caso da controvérsia jurídica sobre a incidência ou não do fator previdenciário a professores, está-se diante de lei federal, havendo, inclusive, expressa determinação do envio do processo ao STJ no voto do relator do STF que conduziu a conclusão pela rejeição da repercussão geral. Leia-se: "Ante o exposto, manifesto-me pela inexistência de repercussão geral da questão tratada nestes autos, determino a remessa do feito ao Superior Tribunal de Justiça, nos termos do art. 1.033 do Código de Processo Civil, e submeto esta deliberação aos demais integrantes desta Corte". (sem destaque no original)

Em consulta à base de jurisprudência do STJ é possível identificar a existência de diversas decisões que concluem pela legalidade da incidência do fator previdenciário no cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição do professor. Para comprovar, apresentam-se alguns exemplos: EDcl no AgInt no AgInt no REsp n. 1.652.482/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe de 7/8/2018; AgInt no REsp n. 1.648.759/RN, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 1/3/2018; AgInt no AgInt no REsp n. 1.666.739/PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 11/12/2017; AgInt no REsp n. 1.681.545/PR, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 21/11/2017; REsp n. 1.654.603/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda

Turma, DJe de 25/04/2017; AgRg no REsp 1.481.976/RS, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 14/10/2015; e REsp 1.423.286/RS, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 1/9/2015.

Ocorre, contudo, que, entre os diversos recursos especiais que são analisados pelo STJ, há, em processos oriundos do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, discussão sobre a aplicabilidade de dispositivos do art. 29 da Lei n. 8.213/1991, na redação dada pela Lei n. 9.876/1999, em virtude do reconhecimento, pela Corte Especial daquele tribunal, da inconstitucionalidade do inciso I do art. 29 da Lei n. 8.213/1991, sem redução de texto, e dos incisos II e III do § 9º do mesmo dispositivo, com redução de texto (Arguição de Inconstitucionalidade n. 50129351320154040000).

Para esses casos, o STJ passou a não conhecer dos apelos ante a inviabilidade de se examinar matéria constitucional em recursos especiais, mantendo, dessa maneira, incólumes decisões do TRF da 4ª Região que afastaram a incidência do fator previdenciário de professor com o fundamento na inconstitucionalidade de dispositivos do art. 29 da Lei n. 8.213/1991, na redação dada pela Lei n. 9.876/1999. Cite-se, por amostragem, o AgInt no REsp n. 1.673.529/RS, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 27/10/2017; o REsp n. 1.673.317/RS, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 9/6/2017; o REsp n. 1.662.698/RS, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe de 26/6/2017; e o REsp n. 1.667.294/RS, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe de 14/6/2017. Não obstante essa posição, o STF, considerando a já citada declaração de ausência de repercussão geral da questão jurídica relacionada à incidência ou não do fator previdenciário do professor (Tema 960), vem determinando a remessa de processos ao STJ e aos tribunais de segunda instância para juízo de adequação ao que foi decidido pelo STF em repercussão geral, inclusive processos em que houve o afastamento do art. 29 da Lei n. 8.213/1991 devido à declaração de inconstitucionalidade pelo TRF da 4ª Região. Com isso, identifica-se a manutenção de decisões proferidas pelo TRF da 4ª Região, possivelmente divergentes da posição prevalecente no Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema, pois os recursos extraordinários que chegam ao STF são devolvidos ao STJ ou aos tribunais de origem com fundamento na ausência da repercussão geral da matéria, enquanto os recursos especiais não são conhecidos no STJ em virtude da discussão sobre matéria constitucional no acórdão recorrido.

O resultado vem sendo que professores que demandam judicialmente na quarta região têm suas aposentadorias calculadas sem a incidência do fator previdenciário. A presente problemática foi analisada pela Primeira Seção, em questão de ordem, suscitada no Recurso Especial n. 1.668.984/RS, decidindo o seguinte (sessão de julgamentos do dia 8/5/2019):

Prosseguindo no julgamento, a Seção, por maioria, nas hipóteses em que já houve julgamento do Recurso Especial pelo não conhecimento do recurso por demandar exame de matéria constitucional, e o Recurso Extraordinário

concomitantemente interposto subiu ao STF e foi julgado determinando "a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça, conforme o disposto no art. 1.033 do CPC" ("Se o Supremo Tribunal Federal considerar como reflexa a ofensa à Constituição afirmada no recurso extraordinário, por pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento como recurso especial"), do que se pressupõe que a decisão anterior do STJ foi cassada (o que afasta o argumento de duplo julgamento pelo STJ), que as Turmas da Primeira Seção julguem a matéria sob o enfoque infraconstitucional, sob pena de desrespeito à autoridade da decisão do STF (hipótese de cabimento de Reclamação) Além dessa providência, em decorrência dos debates surgidos no julgamento do referido Recurso Especial n. 1.668.984/RS, a Primeira Seção, em sessão eletrônica ocorrida entre os dias 8/5/2019 a 14/5/2019, decidiu afetar ao rito dos recursos repetitivos dois recursos especiais oriundos de tribunais diversos do TRF da 4ª Região, com o objetivo de paralisar a tramitação dos processos para a resolução uniforme da questão (ProAfR no REsp n. 1.799.305/PE e ProAfR no REsp n. 1.808.156/SP, acórdãos publicados no DJe de 28/5/2019, vinculados ao Tema repetitivo n. 1.011). -

2 JUSTIFICATIVA

 

Compete ao Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal, no âmbito da gestão de precedentes, identificar e propor alternativas de solução às situações em que se identifiquem dificuldades na aplicação de precedentes qualificados, que possam comprometer a segurança jurídica e a própria efetividade do sistema de precedentes (art. 2º, II, d, da Resolução CJF-RES-2018/00499).

A sistemática de julgamento por amostragem por meio das técnicas dos recursos extraordinários e especiais repetitivos exige uma intensa e necessária inter-relação entre as consequências jurisdicionais e administrativas dos julgamentos. Em regra, a declaração de ausência de repercussão geral ante a identificação, pelo STF, de que a controvérsia jurídica está circunscrita ao âmbito infraconstitucional federal transfere, integralmente, a responsabilidade pela última palavra da questão ao STJ.

No entanto, a declaração de inconstitucionalidade de dispositivos do art. 29 da Lei n. 8.213/1991, na redação da Lei n. 9.876/1999 pela Corte Especial do TRF da 4ª na Arguição de Inconstitucionalidade n. 50129351320154040000, fez surgir, nos processos oriundos dessa região, aspecto que necessita de maior explicitação, qual seja, como conciliar a competência do STJ para o julgamento de matérias infraconstitucionais quando o acórdão regional se funda exclusivamente em matéria constitucional, cuja questão não possui repercussão geral, por ter o STF declarado que o tema tem caráter infraconstitucional. Por outro lado, é importante também que se reflita sobre o efetivo impacto que o julgamento da matéria, pelo STJ, sob a sistemática dos recursos repetitivos, poderá causar a processos em que há a declaração de inconstitucionalidade da lei por Tribunal Regional. Quanto a isso, é essencial uma incursão sobre os exatos termos da manifestação do Relator do feito paradigma do tema 960 da repercussão geral. É que, mesmo havendo a rejeição da repercussão geral da matéria, houve posicionamento expresso sobre a constitucionalidade do art. 29 da Lei n. 8.213/1991, na redação dada pela Lei n. 9.876/1999, tendo Sua Excelência consignado expressamente "que a constitucionalidade do fator previdenciário, tal como instituído pela Lei n. 9.876/99, já foi objeto de pronunciamento desta Corte, no julgamento da ADI 2.111-MC, Rel. Min. Sydney Sanches".

Por outro lado, observando o procedimento de votação no Plenário Virtual, é possível depreender que, na análise do Tema 960 da repercussão geral, os Ministros do STF, por oito votos, além de assentarem, nos termos de orientação firmada naquela Corte, que a natureza infraconstitucional da controvérsia acerca da incidência do fator previdenciário no cálculo da renda mensal inicial do professor impõe a aplicação dos efeitos da ausência de repercussão geral, também se manifestaram no sentido de que, mesmo que o tema fosse de índole constitucional, ele não teria repercussão geral.

Com efeito, os ministros, ao registrarem suas manifestações no Plenário Virtual, o fazem respondendo a três questionamentos sequenciais.

No primeiro quesito, votam quanto à existência ou não de questão constitucional. Na segunda etapa, são registrados os votos sobre a existência ou não de repercussão geral da matéria. Nesse campo devem votar também os ministros que, no primeiro momento, afirmaram a ausência de questão constitucional. Para tanto, após o registro do voto de ausência de questão constitucional, o Ministro é instado a registrar o voto sobre a existência ou não de repercussão geral mediante o seguinte alerta gerado pelo sistema: "Caso vencido, voto quanto à repercussão geral".

Por fim, caso o relator tenha proposto o julgamento imediato do mérito do recurso extraordinário no próprio ambiente virtual, os ministros se manifestam sobre a reafirmação ou não da jurisprudência sobre o tema.

Para melhor visualização, segue tela, de um exemplo fictício simulado em ambiente de testes, do Plenário Virtual do STF:

(exemplo da tela, vide documento PDF) Assim, no caso do Tema 960, considerando que os oito ministros que votaram pela ausência de questão constitucional também se manifestaram no sentido de que, mesmo que houvesse matéria constitucional, ela não teria repercussão geral, foi alcançado o quórum fixado na Constituição Federal para se afastar a repercussão geral de matéria constitucional.

Veja-se a tela do Plenário Virtual disponível na página do STF na internet:

(exemplo da tela, vide documento PDF)

 

Parece-nos, portanto, salvo melhor juízo, que o Supremo Tribunal Federal já firmou posição definitiva sobre a questão, pois, sob ambos os enfoques, o STF concluiu, por votos expressos de oito dos seus membros, pela ausência de repercussão geral da matéria objeto do Tema 960, determinando, ainda, nos termos do art. 1.033 do Código de Processo Civil, que a palavra final sobre a questão caberia ao Superior Tribunal de Justiça, no exercício de sua missão constitucional de uniformizar a interpretação da lei federal em todo o País. Parece-nos, portanto, salvo melhor juízo, que o Supremo Tribunal Federal já firmou posição definitiva sobre a questão, pois, sob ambos os enfoques, o STF concluiu, por votos expressos de oito dos seus membros, pela ausência de repercussão geral da matéria objeto do Tema 960, determinando, ainda, nos termos do art. 1.033 do Código de Processo Civil, que a palavra final sobre a questão caberia ao Superior Tribunal de Justiça, no exercício de sua missão constitucional de uniformizar a interpretação da lei federal em todo o País. Dessa forma, atentando-se para as atribuições institucionais do Centro Nacional de Inteligência, que passou, no ano de 2018, a contar com um representante indicado pela Presidência do STF, é importante que haja o enfrentamento dessa questão por meio de contatos institucionais entre os tribunais, com o relato da situação enfrentada pelo STJ e pelos TRFs, até mesmo porque a questão da possível problemática constitucional envolta nos processos do TRF da 4ª Região foi alertada no momento da análise da repercussão geral do Tema 960 pelo Ministro Marco Aurélio, conforme consta do inteiro teor do acórdão publicado no DJe de 31/8/2017.

É certo que a afetação da matéria pelo STJ ao rito dos repetitivos poderá ensejar a modificação do entendimento até então adotado pela Corte Superior que é, conforme julgados colacionados anteriormente, firme no sentido de ser cabível a aplicação do fator previdenciário na aposentadoria do professor. Contudo, a manutenção da atual jurisprudência do STJ em futuro julgado repetitivo, sem que haja a expressa abordagem sobre a constitucionalidade já reconhecida pelo STF do art. 29 da Lei n. 8.213/1991, na redação dada pela Lei n. 9.876/1999, inclusive para os professores, conservará, salvo melhor juízo, a atual problemática, a permitir que os julgados do TRF da 4ª Região, fundados na inconstitucionalidade da norma, resultem hígidos e que os professores, na mesma região, permaneçam tendo suas aposentadorias livres do redutor decorrente do fator previdenciário. -

3 CONCLUSÃO

 

Nesse sentido, com base na atribuição prevista no inciso II do art. 2º da Resolução CJF-RES-2018/00499, de 1º de outubro de 2018, referente ao gerenciamento de precedentes, sugere-se:

a) o encaminhamento ao STF, pela vice-presidência do TRF da 4ª Região, de recurso extraordinário qualificado como representativo da controvérsia (CPC, art. 1.036) devidamente destacado, para que a Suprema Corte possa deliberar sobre a problemática que decorre, no tema específico, da circunstância de ter sido a questão da incidência do fator previdenciário na aposentadoria de professor "considerada inconstitucional pela Corte Especial do TRF da 4ª Região ¿ qualificada como infraconstitucional no âmbito do STF"; e

b) o encaminhamento da presente nota técnica ao relator dos Recursos Especiais repetitivos n. 1.799.305/PE e 1.808.156/SP, Ministro Mauro Campbell Marques, para eventual avaliação dos pontos nela descritos, em especial quanto à metodologia adotada no Plenário Virtual do STF e quanto à circunstância de que, conforme destacado pelo relator do STF, anteriormente à rejeição da repercussão geral da matéria "fator previdenciário na aposentadoria do professor", ante o seu caráter infraconstitucional, houve a reafirmação da constitucionalidade do art. 29 da Lei n. 8.213/1991, na redação dada pela Lei n. 9.876/1999.

 

Centros de Inteligência da Justiça Federal