Nota Técnica 24 (CIn)/2019

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31/05/2019

Custo das perícias judiciais a cargo do orçamento da Justiça Federal.

Nota Técnica 24/2019 Brasília, 31 de maio de 2019. Assunto: Tema 6. Custo das perícias judiciais a cargo do orçamento da Justiça Federal Relator: Juiz Federal Marco Bruno Miranda Clementino (TRF da 5ª Região) - 1 RELATÓRIO Cuida-se de nota técnica referente ao Tema 6 do Centro Nacional de...
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Nota Técnica 24/2019

 

Brasília, 31 de maio de 2019.

 

Assunto: Tema 6. Custo das perícias judiciais a cargo do orçamento da Justiça Federal

 

Relator: Juiz Federal Marco Bruno Miranda Clementino (TRF da 5ª Região) -

1 RELATÓRIO

 

Cuida-se de nota técnica referente ao Tema 6 do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal, cujo objetivo é promover estudos sobre a problemática do progressivo custo das pericias judiciais a cargo do orçamento da Justiça Federal (ação orçamentária AJPC), em particular em decorrência dos processos previdenciários que tramitam nos juizados especiais federais.

Foi aprovada pelo Grupo Decisório, em 16 de maio de 2018, uma nota técnica preliminar submetida pelo Grupo Operacional, na qual constavam as seguintes propostas de encaminhamento:

I) a realização de audiência pública, com a presença da administração central do INSS, do Ministério do Planejamento, da Defensoria Pública da União, de médicos e de associações de peritos, entre outros atores, visando debater os seguintes pontos:

a) o procedimento da alta programada e seus efeitos;

b) as perspectivas orçamentárias referentes a essa despesa para os próximos exercícios;

d) as alternativas possíveis para ressarcimento das despesas adiantadas pela Justiça Federal para pagamento de peritos, nos casos de procedência ao final do processo;

e) o papel da Defensoria Pública na gestão da assistência jurídica gratuita;

f) o cumprimento pelo INSS de apresentação dos antecedentes médico-periciais e avaliações médicas e sociais dos benefícios judicializados.

II) sejam realizadas, antes da audiência pública, reuniões prévias com o INSS, o Ministério do Planejamento e a Defensoria Pública da União, a fim de delimitar os pontos em discussão;

III) sejam oficiados os Centros Locais de Inteligência e, na falta deles, os coordenadores de Juizados Especiais Federais, para que informem acerca das rotinas empregadas pelas Seções Judiciárias no processamento de ações objetivando a concessão ou o restabelecimento de benefícios assistenciais, assim como as melhores práticas para redução dessa despesa;

IV) seja comunicada a TNU acerca desta nota técnica e do grave risco orçamentário causado pelas Súmulas n. 79 e n. 80, a fim de que ponderem quanto à interpretação das exceções que ela própria estabelece na Súmula n. 79, bem como seja incentivada a participação de seus integrantes na audiência pública;

V) a revisão, pela Corregedoria-Geral da Justiça Federal, dos critérios de fixação da remuneração de peritos à conta da ação orçamentária AJPC (proposição do Ministro Raul Araújo na reunião do Grupo Decisório). Em 07 de agosto de 2018, foi realizada, na sede do Conselho da Justiça Federal, reunião preparatória da audiência pública, com a participação de representantes do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), da Procuradoria Federal

da Advocacia-Geral da União, da Secretaria de Orçamento do Conselho da Justiça Federal (CJF) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Na ocasião, foram colhidas sugestões de encaminhamento para o Tema 6, assim como sobre o formato da audiência pública proposta na primeira nota técnica.

Em 25 de setembro de 2018, o Corregedor-Geral da Justiça Federal, após a apresentação pelo Relator do Tema 06 das conclusões dessa primeira reunião, editou a Portaria da Corregedoria-Geral da Justiça Federal n. 27/2018, criando Grupo de Trabalho para elaboração de um Manual de Perícias Médicas para a Justiça Federal, assim dispondo em seus artigos 1º e 2º:

- Art. 1º. Fica instituído Grupo de Trabalho para elaboração do Manual de Perícias Médicas da Justiça Federal.

- Art. 2º. O Manual de Perícias Médicas da Justiça Federal tem os seguintes objetivos:

I- apresentar elementos que permitam uma melhor articulação entre os conceitos jurídicos e médicos nas perícias médicas judiciais;

II- atuar como facilitador na comunicação entre Juízes Federais e médicos peritos nas quesitações e nos laudos periciais;

III- propor padronização de rotinas na realização de perícias médicas judiciais, inclusive quesitações temáticas;

IV- estabelecer o marco ético de atuação do perito médico judicial;

V- disciplinar de modo adequado a remuneração dos peritos médicos, observando-se, dentre outros critérios pertinentes, a moralidade, a impessoalidade e as limitações orçamentárias da Justiça Federal. Poucos dias antes da realização da audiência pública, em 3 de outubro de 2018, o Presidente da República editou a Medida Provisória n. 854/2018, prescrevendo a transferência, para o Poder Executivo, do ônus orçamentário relativo ao pagamento de perícias médicas nos processos previdenciários contra o INSS no âmbito dos juizados especiais federais.

Em 10 de outubro de 2018, com ampla repercussão e intensa participação de atores interessados, foi realizada a audiência pública referida, cujas notas taquigráficas foram posteriormente reproduzidas pela Coordenadoria de Taquigrafia do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e integram esta nota técnica.

As notas taquigráficas foram enviadas por correio a este Relator e lhe chegaram às mãos somente após o feriado do carnaval deste ano, na primeira semana de março de 2019.

Em 13 de março de 2019, perdeu a vigência, sem aprovação pelo Congresso Nacional, a Medida Provisória n. 854/2018, o que ressuscitou, até com maior gravidade, o problema de custeio das perícias médicas previdenciárias nos juizados especiais federais, já que essa despesa não fora considerada na programação orçamentária da

Justiça Federal para o exercício de 2019.

Em 21 de maio de 2019, o Poder Executivo enviou ao Congresso Nacional o PL n. 2999/2019, que dispõe sobre ¿a antecipação do pagamento dos honorários periciais nas ações em que o Instituto Nacional do Seguro Social figure como parte e que tramitem no âmbito da responsabilidade da Justiça Federal. -

2 JUSTIFICATIVA

 

Conforme já pontuado na primeira nota técnica a afetação do tema se justificou pela grave ameaça à qualidade da prestação jurisdicional e mesmo à viabilidade orçamentária da Justiça Federal em função do acelerado aumento do valor pago, à conta de seu orçamento, por perícias judiciais, sobretudo as realizadas por médicos e assistentes sociais nos processos previdenciários.

O presente tema se enquadra no disposto no art. 2º, inciso I, h, da Resolução n. 499/2018, legitimando a atuação do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal. -

3 FUNDAMENTAÇÃO

 

3.1 Do grave problema orçamentário

 

Após doze meses de trabalho no Tema 6, o custeio das perícias médicas nos processos previdenciários que tramitam nos juizados especiais federais continua figurando como o mais grave problema atualmente enfrentado pela Justiça Federal. O que aparentava ter sido equacionado pela Medida Provisória n. 854/2018 depois se revelou um problema de enorme profundidade, até porque a inadimplência referente ao pagamento dos honorários dos peritos médicos atinge, pelo menos em algumas seções judiciárias, exames realizados ainda no exercício anterior, não quitados pelo

único repasse feito pelo Poder Executivo, em dezembro de 2018.

Com efeito, em que pese editada no início de outubro de 2018, a eficácia da Medida Provisória n. 854/2018 dependeu de normatização conjunta do CJF e do Ministério do Planejamento, bem como da aprovação de crédito extraordinário pelo Congresso Nacional e, em função disso, o primeiro repasse para pagamento do elevado valor que se encontrava em aberto, referente a 2018, somente se deu no apagar das luzes do exercício, nos últimos dias de dezembro e já durante o recesso forense. Se isso não bastasse, em algumas seções judiciárias o valor disponibilizado não foi suficiente para quitação do passivo, tendo sido também enfrentadas dificuldades com a extração do relatório da AGJ que discriminava as perícias enquadradas na forma de pagamento estabelecido pela Medida Provisória n. 854/2018. Esperava-se, portanto, o primeiro repasse de 2019 a fim de que o restante fosse regularmente adimplido.

Infelizmente, em 13 de março de 2019, a Medida Provisória n. 854/2018 perdeu sua vigência, nos termos do art. 62, §§ 6º e 7º, da Constituição Federal, por não apreciação pelo Congresso Nacional. Isso se deu antes de qualquer repasse do Poder Executivo à Justiça Federal para fins de pagamento das perícias realizadas até então, inclusive as pendentes do exercício de 2018. Não se pode afirmar que a Justiça Federal vive um impasse, tendo em vista o envio do PL 2.999/2019. Entretanto, os juizados especiais federais enfrentam um problema gravíssimo no país inteiro, com evasão de peritos médicos, às vezes antigos integrantes dos respectivos quadros, bem como risco imediato de paralisação parcial da prestação jurisdicional.

A esse respeito, é preciso destacar, a propósito do que se pôde colher na audiência pública, inclusive nos debates informais, que após o reconhecimento pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), em 2011, da perícia como especialidade médica, alguns profissionais passaram a se dedicar com exclusividade à atuação como peritos médicos da Justiça Federal. Esses profissionais encontram-se, portanto, sem qualquer remuneração já há vários meses e muitos deles continuam a prestar o serviço com a perspectiva de regularização breve do pagamento. Diante desse problema, propõe-se:

I) a manutenção do Tema 6 em supervisão de aderência, até que o problema seja resolvido definitivamente, inclusive por um tempo para maturação do procedimento a ser futuramente observado, permitindo-se um diálogo posterior com os diretores de foro, área orçamentária do CJF e dos tribunais, peritos médicos, entre outros, a fim de serem propostos eventuais ajustes que se fizerem necessários;

II) sejam solicitadas, com brevidade, aos Centros Locais de Inteligência, informações gerais sobre a evasão de peritos, o impacto geral na tramitação dos processos judiciais, as alternativas buscadas para mitigação do problema e os valores devidos em cada seção judiciária, com a indicação da extensão temporal da inadimplência, objetivando subsidiar a Presidência do CJF no acompanhamento dessa matéria;

III) a extração pelo CJF dos dados do AJG referentes às pendências com o pagamento de peritos médicos pela Justiça Federal, com o detalhamento por seção judiciária. -

3.2 Aperfeiçoamento das perícias

 

Foram muitas as sugestões, tanto na reunião prévia, quanto na audiência pública, para aperfeiçoamento das perícias médicas realizadas pela Justiça Federal nos processos judiciais que têm como objeto benefícios previdenciários por incapacidade.

Já na reunião prévia, o INSS e a Procuradoria Federal fizeram menção ao Manual de Perícia Médica do INSS, destacando o importante auxílio que este oferecia aos seus então peritos (agora vinculados ao Ministério da Economia) na elaboração de seus laudos.

Em reunião deste relator com o então Corregedor-Geral da Justiça Federal, Ministro Raul Araújo, foi apresentada proposta de constituição de Grupo de Trabalho para elaboração de um Manual de Perícias Médicas da Justiça Federal, resultando na edição da Portaria da Corregedoria-Geral da Justiça Federal n. 27/2018. O referido Grupo reuniu-se pela primeira vez neste ano de 2019, encontrando-se em atividade.

Houve, também, sugestão, na reunião prévia e na audiência pública, de se incentivar os juízes federais a conhecerem o Manual de Perícias do INSS, o que pode ser efetivado por meio de solicitação aos Centros Locais de Inteligência da Justiça Federal.

Outra observação bastante recorrente, seja na reunião prévia, seja na audiência pública, dizia respeito à conveniência de padronização nacional dos quesitos aplicados nas perícias médicas da Justiça Federal, a exemplo do que existe em algumas seções judiciárias, como as de São Paulo e do Rio Grande do Sul. Essa sugestão partiu, a rigor, tanto de representantes da Advocacia-Geral da União (AGU), quanto da OAB, forte na premissa de que a "quesitação" única diminui o subjetivismo, promove segurança jurídica e isonomia, além de permitir melhor capacitação dos peritos para associação entre os conceitos jurídicos e médicos.

A rigor, essa proposta também foi noticiada pelo relator ao então Corregedor-Geral, Ministro Raul Araújo, e por isso consta da Portaria da Corregedoria-Geral da Justiça Federal n. 27/2018 como atribuição do Grupo de Trabalho por ela criada. Todavia, em fevereiro de 2019, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu outro Grupo de Trabalho para elaboração de uma "quesitação" padronizada para implementação de um módulo eletrônico no PJe para confecção de laudos periciais, a ser disponibilizado também no âmbito da competência federal delegada. Diante disso, a fim de evitar sobreposição de trabalho para viabilizar concretamente a ideia, parece ser relevante recomendar formalmente ao Grupo de Trabalho criado no CJF que atue em sintonia com o do CNJ, de modo a se conceber uma "quesitação" única que atenda ao máximo aos interesses institucionais da Justiça Federal.

Outra sugestão recorrente foi a instituição de uma política pública destinada à capacitação permanente de peritos médicos, inclusive vinculando o credenciamento do profissional nos quadros da Justiça Federal à frequência nos cursos a serem oferecidos. O Grupo de Trabalho criado no âmbito do CNJ também recebeu a atribuição de se debruçar sobre esse tema, sendo importante o acompanhamento pelo CJF.

Portanto, recomenda-se seja oficiada a Conselheira Daldice Santana, responsável por referido Grupo de Trabalho, solicitando informações sobre o andamento dessa ação no âmbito do CNJ. Sugere-se, ainda, que o Grupo de Trabalho já criado no âmbito do CJF seja instado a apresentar sugestões sobre essa matéria, para fins de envio ao CNJ. Outro aspecto suscitado foi a necessidade de se trabalhar de forma mais qualificada, com dados e estatísticas referentes à atuação de cada perito, possibilitando um melhor planejamento da atividade. Em alguns estados, a AGU já iniciou trabalho semelhante e chegou a conclusões interessantes sobre a atuação dos peritos judiciais.

Essa sugestão é particularmente importante porque os Centros de Inteligência foram concebidos para promoverem gestão do conhecimento na Justiça Federal e, para isso, a disponibilidade de dados, sempre confiáveis, consiste num

pressuposto essencial. Nesse sentido, convém colher junto aos Centros Locais de Inteligência informações sobre boas práticas nessa matéria específica, assim como sugestões de metadados a serem considerados numa eventual política pública, inclusive para possível incorporação de campos próprios nos sistemas de processo eletrônico. Tal proposta pode ser associada a outra, de avaliação constante dos peritos.

A esse respeito, a Seção Judiciária do Rio Grande do Norte está prestes a concluir um aplicativo colaborativo de avaliação de peritos, que pode ser apresentado aos Centros Locais de Inteligência para fins de implantação e colheita de sugestões de aprimoramento. -

3.3 Cultura pericial

 

Um dos assuntos mais interessantes debatidos na audiência pública e na reunião que a antecedeu foi a constatação de que, no curso dos anos, uma espécie de "cultura pericial" enraizou-se na jurisdição previdenciária nos juizados especiais federais, em particular nos processos judiciais referentes a benefícios previdenciários

por incapacidade.

Não há dúvida de que a simples criação dos juizados especiais federais, cuja instalação se deu em 2002, teve um impacto significativo nesse contexto, mas o fato é que, segundo dados apresentados na audiência pública por Gustavo Bicalho, Secretário de Orçamento do CJF, as despesas com perícias na Justiça Federal cresceram 4.995%

entre 2001 e 2018, elevando-se de 4.7 milhões para 240 milhões, observadas as curvas de crescimento a partir de 2010 expostas na última nota técnica.

Na nota técnica anterior, houve menção específica às Súmulas n. 79 e n. 80 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) como potenciais influenciadoras desse fenômeno, mas a polifonia dos debates parece ter deixado claro que essa não é uma característica atomizada. Ao que se afigura, o excessivo volume de processos e a eventual dificuldade de interpretação de elementos técnicos geraram no inconsciente coletivo ¿ aí incluídos juízes, procuradores e advogados "um apego à prova pericial".

Essa afirmação se aplica a perícias médicas e sociais. No caso das perícias médicas, já se mencionava, na nota técnica anterior, (I) a quantidade de processos nos quais era realizada mais de uma perícia; nos debates posteriores, constatou-se também a grande quantidade de (II) anulações de sentença com a determinação de refazimento

de perícias; por fim, houve referência à (III) desnecessidade, em muitos casos, da realização imediata da perícia logo após o despacho inicial, nos termos da Recomendação Conjunta n. 1/2015 do CNJ. Quanto às perícias sociais, o maior debate girou em torno do teor das Súmulas n. 79 e n. 80 da TNU.

A propósito da perícia social, o Procurador Federal Vítor Fernando Gonçalves Cordula afirmou textualmente, em sua manifestação na audiência pública, que "não há uma orientação por parte da Procuradoria, da AGU, da Procuradoria Especializada do INSS, no sentido de instigar e estimular os colegas a solicitar a realização da prova pericial, porque ela não é feita, digamos assim, não seria feita no processo administrativo". E prossegue: "Ela não é feita no âmbito administrativo porque não há parâmetros objetivos para realizá-la. Quando há essa solicitação no âmbito judicial,

reconhece-se a possibilidade que o Judiciário tem de valorar essa prova". Convém registrar que essa mesma afirmação foi feita pelos representantes da AGU que compareceram à reunião prévia. Assim, é importante fazer o registro do posicionamento oficial da defesa do INSS quanto à desnecessidade formal dessa prova.

E, ainda que não se pretenda interferir na competência jurisdicional de cada juiz federal ou turma recursal, é importante que esse posicionamento institucional do INSS seja amplamente divulgado pelos Centros Locais de Inteligência.

No que se refere às perícias médicas, foi possível detectar o desconhecimento, por muitos, de uma circunstância técnica importante: a perícia médica é, desde 2011, uma especialidade da Medicina. Por isso, é equivocado estimular

a realização de perícias pelo médico especialista na doença do periciado (ex.: oftalmologista, ortopedista etc.), até porque este não é capacitado, em princípio, para a análise histórico-ocupacional e da profissiografia, além de outros elementos necessários à realização do trabalho pericial.

Segundo apurado nos debates, a exigência de um médico especialista na doença consiste numa causa recorrente de anulação de sentenças e de determinações de realização de mais de uma perícia médica por processo judicial. A prova pericial produzida pelo médico do trabalho e, sobretudo, pelo médico perito, não deve ser valorada como inferior à de um especialista na doença, senão pelo contrário. Aliás, essa foi a maior queixa também dos peritos médicos do INSS, porque entendem ser indevida a desconsideração do trabalho que desenvolvem administrativamente por um profissional que, no entender da categoria, não teria a mesma qualificação específica do

que eles para atuação na área pericial.

Nesse sentido, é fundamental que essa informação seja levada, pelos Centros Locais de Inteligência, aos juízes federais atuantes nos juizados especiais federais e em turmas recursais. Também deve ser recomendado que busquem o credenciamento preferencial de médicos com especialidade em perícia nos quadros de pessoal da Justiça Federal.

Quanto à elevada quantidade de anulações de sentenças, o eventual subjetivismo, como já foi referido, pode ser enfrentado por meio da padronização de quesitos e da promoção de uma política pública de capacitação permanente dos peritos.

Por fim, quanto à Recomendação Conjunta n. 01/2015 do CNJ, para além de se recomendar maior rigor nas triagens das petições iniciais, já que não raras vezes são realizadas perícias em processos cujo ponto controvertido é qualidade de segurado, é importante ouvir o Comitê Gestor Nacional da Conciliação do CNJ a respeito. Em sua manifestação na audiência pública, a Defensoria Pública da União (DPU) defendeu a criação de uma Câmara de Conciliação entre ela e o INSS, de modo a que se tente o acordo antes mesmo da perícia judicial. Assim, o Comitê, no CNJ, pode avaliar a conveniência de impulsionar essa ideia, assim como o próprio CJF. Por fim, quanto à cultura pericial, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), numa excelente e sólida reflexão da Juíza Federal Clara da Mota Santos Pimenta Alves, propôs a realização de um estudo empírico, numa vara-piloto, "em que possamos verificar que documentos poderiam ser considerados por esse magistrado, e, caso venha a ser feita uma perícia social depois, se essas perícias sociais bateriam com o juízo que esse magistrado faz se ele fizer apenas uma análise documental". Em linhas gerais, a preocupação da AJUFE também se refere ao subjetivismo. Não há indicativo da existência de estudos na Justiça Federal quanto à prova documental mais adequada para substituição de uma perícia social. Também não existe estudo empírico sobre o grau de certeza obtido com a produção de prova oral em audiência,

como era feito antes das Súmulas n. 79 e n. 80 da TNU. A AJUFE, por outro lado, teme que uma mudança radical de postura resulte no sacrifício de direitos fundamentais pelos segurados. Nesse sentido, a proposta da AJUFE, além de bastante qualificada, vincula a análise ao necessário caráter científico de que um tema como este precisa se revestir.

Um último aspecto, debatido na reunião do Grupo Operacional do Centro Nacional de Inteligência, diz respeito à necessidade de uma reflexão no tocante ao procedimento em si de se realizarem perícias médicas indistintamente em todos os processos judiciais relativos a benefícios por incapacidade, assim como ao fato de se encontrarem soluções para um maior envolvimento dos peritos médicos federais (agora vinculados ao Ministério da Economia e não mais ao INSS) nos processos judiciais. -

3.4 Questões operacionais

 

Não menos importantes, algumas questões operacionais foram também suscitadas nos debates. A mais recorrente diz respeito à apresentação pelo INSS dos laudos administrativos e das informações médicas sobre os segurados constantes de sistemas do INSS. Nesse aspecto, seja na reunião prévia, seja na audiência pública, o INSS e a AGU foram enfáticos no sentido de que não entendem haver impedimento à apresentação desses documentos e informações. Tanto essa é a posição oficial do INSS, que essa permissão consta do seu Manual de Perícias. Se isso não bastasse, essa possibilidade consta expressamente da Resolução n. 2.183/2018, do Conselho Federal de Medicina (CFM). Em reuniões do Centro Nacional de Inteligência com o INSS referentes a outros temas, esse assunto tem sido tratado de forma recorrente, a fim de que se desenvolva um fluxo para apresentação desses dados ou para que se estabeleça um mecanismo de acesso das varas federais aos sistemas em que são armazenadas administrativamente essas informações médicas, atentando-se inclusive para o disposto no artigo 124-B da Lei n. 8.213/1991 (com a redação da Medida Provisória n. 871/2019.

Essa talvez tenha sido a solicitação mais enfática nos debates. Por isso, é fundamental que o Centro Nacional de Inteligência insista na definição de uma estratégia, com a concepção de um fluxo menos burocrático possível, sendo importante sinalizar à Secretaria de Informática do CJF, caso necessária sua atuação, quanto à

prioridade desse trabalho.

Uma queixa de advogados e defensores públicos é a dificuldade de compreensão do motivo de indeferimento do benefício a partir das informações constantes da carta respectiva. Reportam a dificuldade de elaborar petições com

fundamentações mais específicas. Essa questão já foi tratada superficialmente com o INSS em outras reuniões do Centro Nacional de Inteligência, porém merece ser retomada, sobretudo porque, com a absorção da carreira de perito médico previdenciário pelo Ministério da Economia, um novo sistema está sendo concebido para gestão dessas informações.

Também foi sugerida a criação de fluxos unificados de tramitação desses feitos relativos a benefícios por incapacidade, inclusive para facilitar a apresentação, pelo INSS, das informações e dos documentos referidos no parágrafo anterior. A esse respeito, seria interessante que o Grupo de Trabalho criado para elaboração do Manual de Perícia sugerisse um fluxo, a fim de que o Centro Nacional de Inteligência possa debatê-lo com os demais atores envolvidos no tema. -

3.5 Outras sugestões

 

Outras questões foram abordadas, as quais, no entender deste relator, mereceriam, por sua amplitude, ser tratadas como temas específicos, a critério do Centro Nacional de Inteligência:

I) a gratuidade judiciária, já devidamente afetada como Tema do Centro Nacional de Inteligência;

II) a problemática envolvendo a competência federal delegada;

III) a necessidade de revisão da remuneração dos peritos;

IV) a criação de cargos de peritos médicos nos quadros de pessoal da Justiça Federal, havendo, quanto a este aspecto, estudo do Desembargador Federal Jorge Maurique, do TRF da 4ª Região, que pode subsidiar uma maior reflexão sobre o assunto. -

4 CONCLUSÕES

 

Com base na fundamentação exposta, propõe-se:

I) a manutenção deste Tema 6 em supervisão de aderência até que esse problema seja resolvido definitivamente, inclusive considerando um tempo para maturação do procedimento a ser futuramente observado, permitindo-se um diálogo posterior com os diretores de foro, área orçamentária do CJF e dos tribunais, peritos médicos, entre outros, a fim de serem propostos eventuais ajustes que se fizerem necessários;

II) a solicitação aos Centros Locais de Inteligência, com a maior brevidade, de informações gerais sobre a evasão de peritos, o impacto geral na tramitação dos processos judiciais, as alternativas buscadas para mitigação do problema e os valores devidos nas seções judiciárias, com a indicação da extensão temporal da inadimplência, para subsidiar a presidência do CJF no acompanhamento dessa matéria;

III) a extração, pelo CJF, dos dados do Sistema AJG referentes às pendências com o pagamento de peritos médicos pela Justiça Federal, com o detalhamento por seção judiciária.

IV) a elaboração de um Manual de Perícias Médicas da Justiça Federal, com base no trabalho desenvolvido por Grupo já instituído para esse fim;

V) a divulgação, pelos Centros Locais de Inteligência, do Manual de Perícias do INSS, possibilitando que os juízes federais conheçam os posicionamentos oficiais do INSS quanto aos aspectos técnicos sobre o assunto;

VI) a elaboração de "quesitação" única como proposta de padronização nacional, inclusive com a disponibilização de

módulo eletrônico nos sistemas processuais;

VII) o alinhamento, quanto à "quesitação" única, com o Grupo de Trabalho também instituído no CNJ para essa finalidade, com o objetivo os interesses da Justiça Federal sejam contemplados;

VIII) a apresentação de sugestões, pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria da Corregedoria-Geral da Justiça Federal n. 27/2018, para a criação de uma política nacional de credenciamento e capacitação permanente de peritos; IX) o alinhamento, quanto à política de capacitação, com o Grupo de Trabalho instituído pelo CNJ;

X) a coleta, junto aos Centro Locais de Inteligência, de boas práticas quanto ao levantamento de dados sobre a atuação dos peritos, assim como sugestões de metadados para possível incorporação de campos próprios nos sistemas de processo eletrônico;

XI) a criação de uma prática de constante avaliação de peritos pelas seções judiciárias;

XII) a disseminação pelos Centros Locais de Inteligência quanto às constatações sobre a ¿cultura pericial¿ expostas no capítulo III desta nota técnica;

XIII) seja ouvido o Comitê Gestor Nacional da Conciliação sobre o item 41 desta nota técnica;

XIV) a busca de uma vara federal disposta a realizar o estudo sugerido pela AJUFE, descrito nos itens 42 a 44 desta nota técnica;

XV) que o Centro Nacional de Inteligência intensifique as tratativas com o INSS visando à implementação das questões operacionais indicadas no capítulo IV;

XVI) submeter ao Grupo Operacional a conveniência e a oportunidade de afetar os temas indicados no capítulo V;

XVII) a produção, pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ), de videoaulas para disseminação do conteúdo desta nota técnica aos juízes federais e servidores;

XVIII) o envio desta nota técnica às Escolas de Magistratura Federal com a finalidade de gerar conteúdo de formação para juízes federais e de capacitação de servidores;

XIX) a análise desta nota técnica pelo CEJ, para geração de conteúdo de formação para juízes federais e de capacitação de servidores.

 

Centros de Inteligência da Justiça Federal