Nota Técnica 19 (CIn)/2018

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28/08/2018

 

Nota Técnica com sugestões para a gestão do acervo de processos e recursos,

relacionado com precedente qualificado em torno do Tema n. 69 (incidência das

contribuições sociais PIS/COFINS sobre o ICMS).

Nota Técnica n. 19/2018 Brasília, 28 de agosto de 2018. Assunto: ICMS/Base de cálculo do PIS-COFINS/Recurso Extraordinário - Modulação Relator: Juiz Federal Erik Frederico Gramstrup Revisor: Juiz Federal Raphael José de Oliveira Silva - O Centro de Inteligência da Justiça Federal, criado pela...
Texto integral

Nota Técnica n. 19/2018

 

Brasília, 28 de agosto de 2018.

 

Assunto: ICMS/Base de cálculo do PIS-COFINS/Recurso Extraordinário - Modulação

 

Relator: Juiz Federal Erik Frederico Gramstrup

 

Revisor: Juiz Federal Raphael José de Oliveira Silva -

O Centro de Inteligência da Justiça Federal, criado pela Portaria CJFPOR- 0369/2017, junto ao Conselho da Justiça Federal, vem apresentar Nota Técnica com sugestões para a gestão do acervo de processos e recursos,

relacionado com precedente qualificado em torno do Tema n. 69 (incidência das contribuições sociais PIS/COFINS sobre o ICMS). Esclarece-se que esta Nota Técnica apresenta afinidade com o assunto de que trata a Nota Técnica n. 8/2018, referente ao instante do levantamento do sobrestamento de feitos e à aplicação do art. 1.040 do CPC. A

NT n. 08/2018, porém, enfatizava o impacto de precedentes no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, enquanto que a presente nota se dirige, especificamente, à tese firmada no âmbito do Supremo Tribunal Federal, em

julgamento vinculante de recurso extraordinário sujeito a embargos declaratórios. -

PROBLEMA

 

Enxerga-se a necessidade de alinhar os procedimentos adotados, a bem da estabilidade e segurança na aplicação do Direito, relativamente aos milhares de julgamentos e juízos de retratação envolvidos no assunto subjacente

à presente nota técnica, bem como na solução de pendências residuais ainda em primeiro grau, seja em ações impugnativas de crédito tributário, seja em execuções fiscais da Fazenda Nacional.

Assim como sucedeu com a NT n. 8/2018, a problemática aqui examinada está, em parte, sob a regência do art. 1.040 do CPC, conquanto relativamente a tema especificamente julgado ¿ mas não definitivamente ¿ no

âmbito do Supremo Tribunal Federal. -

FUNDAMENTAÇÃO

 

O fato gerador do ICMS, grosso modo, é a circulação de mercadorias ou a prestação de serviços de comunicação e os de transporte interestadual e intermunicipal. Este imposto incide também sobre o fornecimento de

alimentação, bebidas e outras mercadorias em qualquer estabelecimento. Vale ressaltar que o ICMS detém materialidades múltiplas, dentre as quais: a) a operação propriamente mercantil de circulação de mercadorias; e b) a prestação de serviços de comunicação ou de transportes, não abrangida pela competência impositiva deferida pelo texto constitucional aos municípios.

O faturamento da empresa, base própria de certas contribuições sociais (art. 195, I, da Constituição da República), compreende a receita bruta, tal como definida na legislação do Imposto sobre a Renda, proveniente de venda

de mercadorias nas operações de conta própria, e do preço dos serviços prestados; ou o valor do resultado auferido, naquelas de conta alheia.

Aparentemente, abrangeria todos os valores brutos recebidos em pagamento da contraprestação, fosse mercadoria ou serviço. De modo que o imposto estadual, incidente sobre a circulação de mercadorias (e prestação de certos serviços - art. 155, II, da CF/88), no entender do Fisco, incluir-se-ia no faturamento, para

fim de cálculo das contribuições sociais respectivas. Anteriormente ao julgado do Supremo Tribunal Federal, a Súmula de Jurisprudência Dominante do Superior Tribunal de Justiça alinhava-se com a pretensão fiscal, por meio dos

Enunciados n. 68 ("parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do PIS") e n. 94 (¿a parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de cálculo do FINSOCIAL, hoje superados.

Essa aparente pacificação jurisprudencial foi abalada quando a Colenda Suprema Corte proferiu decisão, no RE n. 240.785, no sentido de exclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins e, mais ainda, reconheceu repercussão geral sobre o tema nos autos do RE n. 574.706, como se passa a detalhar em sequência.

Em julgamento realizado a 24/4/2008, tendo como relatora a Ministra

Cármen Lúcia, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o thema decidendum era dotado de repercussão geral, conforme ementa e decisão publicadas no DJe de

15/5/2008:

"Reconhecida a repercussão geral da questão constitucional relativa à inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS e da contribuição ao PIS. Pendência de julgamento no Plenário do Supremo Tribunal Federal do Recurso Extraordinário n.240.785. (RE 574706 RG, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em

24/04/2008, DJe-088 15-05-2008)"

 

O Supremo Tribunal Federal também julgou o RE n. 240.785, no sentido da exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins, com efeito inter partes. Da ata de julgamento consta o seguinte resultado:

 

"Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, deu provimento ao recurso extraordinário, vencidos os Ministros Eros Grau e Gilmar Mendes. Não participou da votação a Ministra Rosa Weber, com fundamento no art. 134, § 2º, do RISTF. Não votaram os Ministros Roberto Barroso, Teori Zavascki, Luiz Fux e Dias Toffoli, por sucederem, respectivamente, aos Ministros Ayres Britto, Cezar Peluso, Eros Grau e Sepúlveda Pertence. Ausentes a Ministra Cármen Lúcia, representando o Tribunal na Viagem de Estudos sobre Justiça

Transicional, organizada pela Fundação Konrad Adenauer, em Berlim, entre os dias 5 e 9 de outubro de 2014, e na 100ª Sessão Plenária da Comissão Europeia para a Democracia pelo Direito

(Comissão de Veneza), em Roma, nos dias 10 e 11 subsequentes, e o Ministro Dias Toffoli que, na qualidade de

Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, participa do VII Fórum da Democracia de Bali, na Indonésia, no período de 8 a 13 de outubro de 2014. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 08.10.2014."

 

Do voto do Relator, Min. Marco Aurélio, extrai-se:

 

"Da mesma forma que esta Corte excluiu a possibilidade de ter-se, na expressão ¿folha de salários", a inclusão do que satisfeito a administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão maior, entender que a expressão "faturamento" envolve, em si, ônus fiscal, como é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezarse

o modelo constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição, relativamente a valor que não passa a integrar o patrimônio do alienante quer de mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS. Se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o vendedor da mercadoria. Admitir o contrário é querer, como salientado por Hugo de Brito Machado em artigo publicado sob o título "Cofins - Ampliação da base de cálculo e compensação do aumento de alíquota", em "CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS - PROBLEMAS JURÍDICOS", que

a lei ordinária redefina conceitos utilizados por norma constitucional, alterando, assim, a Lei Maior e com isso

afastando a supremacia que lhe é própria. Conforme previsto no preceito constitucional em comento, a base de cálculo é única e diz respeito ao que faturado, ao valor da mercadoria ou do serviço, não englobando, por isso mesmo, parcela diversa. Olvidar os parâmetros próprios ao instituto, que é o faturamento, implica manipulação geradora de insegurança e, mais do que isso, a duplicidade de ônus fiscal a um só título, a cobrança da

contribuição sem ingresso efetivo de qualquer valor, a cobrança considerada, isso sim, um desembolso. Por tais razões, conheço deste recurso extraordinário e o provejo para, reformando o acórdão proferido pela Corte de origem, julgar parcialmente procedente o pedido formulado na ação declaratória intentada, assentando que não se inclui na base de cálculo da contribuição, considerado o faturamento, o valor correspondente ao ICMS.

Com isso, inverto os ônus da sucumbência, tais como fixados na sentença prolatada."

 

Por fim, o julgado em referência foi assim ementado:

 

"TRIBUTO - BASE DE INCIDÊNCIA  - CUMULAÇÃO - IMPROPRIEDADE. Não bastasse a ordem natural das coisas, o

arcabouço jurídico constitucional inviabiliza a tomada de valor alusivo a certo tributo como base de incidência de outro.

COFINS - BASE DE INCIDÊNCIA - FATURAMENTO - ICMS.

O que relativo a título de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e a Prestação de Serviços não compõe a base de

incidência da Cofins, porque estranho ao conceito de

faturamento." (RE 240.785, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 08/10/2014, DJe-246 DIVULG 15-12-2014. PUBLIC 16-12-2014 EMENT VOL-02762-01 PP-00001)" Em 15/3/2017, ao julgar o mérito do tema a que fora atribuída repercussão geral, o Plenário do . Supremo Tribunal Federal, por maioria e nos termos do voto da Relatora, Ministra Cármen Lúcia (Presidente), apreciando o tema n. 69, deu provimento ao Recurso Extraordinário n. 574.706 e fixou a seguinte tese: "O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS". Ficaram vencidos os Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso,

Dias Toffoli e Gilmar Mendes. A decisão foi publicada em 2/10/2017. Consta o

seguinte extrato de ata:

 

"Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Relatora, Ministra Cármen Lúcia (Presidente), apreciando o

tema 69 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário e fixou a seguinte tese: "O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins". Vencidos os Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Nesta assentada o Ministro Dias Toffoli aditou seu voto. Plenário, 15.3.2017."

 

Por fim, o aspecto crucial, no que diz respeito à presente Nota Técnica: não houve modulação na aplicação da tese jurídica, restando dúvida, para as instâncias ordinárias, a propósito da aplicação ex nunc ou ex tunc do julgado vinculante. A União interpôs embargos de declaração em outubro de 2017, nos autos do Recurso Extraordinário n. 574.706, com o propósito, precisamente, de modular os efeitos do julgamento, o que até hoje se aguarda. Concomitantemente aos embargos declaratórios "e até mesmo no prazo de sua interposição" a União passou a questionar os graus ordinários de jurisdição, na medida em que juízos e tribunais passaram a dar aplicação ao precedente do STF, do modo como se sintetiza em seguida. Desde logo, observa-se que duas posições básicas seriam possíveis: (1) Aplicar a tese e precedente vinculantes na forma literal do art. 1.040 do CPC, isto é, desde a publicação. Esse modus procedendi encontra sustento na própria literalidade do dispositivo legal, mas também nas seguintes considerações: (a) a ausência de decisão implicaria não ter havido, em linha de princípio, modulação; (b) os embargos declaratórios não têm, por si mesmos, efeito suspensivo sobre o julgado; e (c) a Fazenda estaria contando com resultado de julgamento

futuro, sem estribo suficiente.

(2) Aguardar o julgamento dos embargos declaratórios. Esse procedimento teria, a seu favor, um sentido prático: evitar o desfazimento de efeitos consumados pela aplicação imediata do precedente e tese vinculantes, como, por exemplo, o levantamento de valores depositados e a desconstituição de títulos executivos. Além disso, seria mais conservadora, no melhor sentido da expressão, buscando evitar prejuízos e reviravoltas no processamento dos feitos

subjacentes. Conforme foi possível apurar, o TRF da 1ª Região, por sua vicepresidência, adotou o precedente qualificado, fazendo cessar o sobrestamento dos feitos, com a publicação do julgamento no âmbito do Supremo Tribunal Federal. As Turmas daquele Tribunal, a seu turno, passaram a aplicar a tese desde que tiveram notícia do julgamento.

A seu turno, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região adotou o procedimento de aguardar o julgamento dos Embargos de Declaração opostos nos autos do RE n. 574.706. Seu Núcleo de Gerenciamento de Precedentes

informou existirem 360 processos suspensos em razão do Tema n. 69. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em sintonia com a orientação adotada por sua Vice-Presidência, no sentido de que o marco para aplicação da tese fixada em sede de repercussão geral seria o momento da publicação do acórdão do STF, ¿zerou¿ o acervo de 550 processos apurado em março de 2018. Ficaram sobrestados 168 feitos, em razão da pendência de julgamento em torno do Tema (associado) n. 118, envolvendo também outro tributo, o Imposto sobre Serviços.

A Vice-Presidência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, da mesma forma, passou a aplicar o Tema n. 69 tão logo publicado o acórdão do STF, informando que o acervo era, na época, de aproximadamente 4.000 processos. Reportou, ainda, que não há mais processos sobrestados e que eventual resíduo é imediatamente despachado, seja para retratação, seja para a negativa de seguimento de recurso.

No âmbito do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, o tema n. 69 foi aplicado aos aproximadamente 1.000 feitos sobrestados quando da publicação do acórdão emanado do STF.

Note-se que a maioria dos tribunais aguardou a publicação e lhe deu aplicação imediata, na medida em que seus recursos humanos e materiais o permitiram. O TRF2 consistiu a exceção, preferindo aguardar o julgamento dos

embargos declaratórios; bem como o TRF1, particularmente à solução adotada por suas Turmas.

Também no primeiro grau de jurisdição sentiram-se os efeitos da controvérsia reinante entre Fazenda Nacional e Contribuintes/Responsáveis Tributários, notadamente em ações impugnativas do crédito tributário, com a pretensão de levantar valores depositados e em execuções fiscais, discutindose, no último caso, se o título executivo (e eventuais garantias formalizadas por depósito ou penhora) seriam ou não subsistentes. E, naturalmente, se uns e

outros poderiam ou não prosseguir sobrestados em primeiro grau. Por todo o exposto, assim como se discutiu, por ocasião da Nota Técnica n. 8/2018, mas com maior ênfase dirigida aos julgados de recursos assim ditos ¿repetitivos¿ no âmbito do STJ, o equacionamento do problema passaria também pela modulação de plano dos efeitos de julgados em recursos extraordinários com repercussão geral.

Destaque-se, por fim, que o Superior Tribunal de Justiça mantém tese em recurso repetitivo no tema 313. Eis o teor: "O valor do ICMS, destacado na nota, devido e recolhido pela empresa compõe seu faturamento, submetendo-se

à tributação pelas contribuições ao PIS/PASEP e COFINS, sendo integrante também do conceito maior de receita bruta, base de cálculo das referidas exações."

Diante da aparente contradição entre os posicionamentos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, a nota técnica propõe que os tribunais regionais federais subsidiem, com a seleção de recursos

especiais na origem, a eventual revisão da tese formulada no tema 313 do STJ. -

CONCLUSÃO

Diante da exposição supra, propõe-se o encaminhamento da presente Nota Técnica à Presidência do Supremo Tribunal Federal, para que aquela Corte tenha conhecimento dos problemas levantados e avalie, se entender

conveniente e oportuno, a possibilidade de modular, de imediato e quando cabível, os efeitos dos julgados de temas afetados à repercussão geral; e, ainda, para que avalie a conveniência de pronunciar-se expressamente sobre a

aplicabilidade imediata (ou não) desses julgados, quando da pendência de recursos e impugnações.

Propõe-se também aos tribunais regionais federais que selecionem recursos especiais representativos de controvérsia para subsidiar eventual revisão da tese formulada no Tema 313 do STJ. Neste contexto, encaminhe-se

a presente nota técnica à Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.

 

Centros de Inteligência da Justiça Federal