Terminal de consulta web

Nota Técnica 1 (CLIMS)/2019

Nota Técnica 1 (CIJF/MS), de 2019

Outros

Assistência Judiciária Gratuita - AJG

NOTA TÉCNICA (CIJF/MS) Nº 01/2019 Mato Grosso do Sul - 2019 Problema: a concessão incontrolada da gratuidade judiciária na admissão de demandas provoca excesso de litigiosidade. - Diagnóstico. A praxe judiciária nos indica um número elevado de processos onde há pedido de gratuidade... Ver mais
Texto integral

NOTA TÉCNICA (CIJF/MS) Nº 01/2019

 

Mato Grosso do Sul - 2019

 

Problema: a concessão incontrolada da gratuidade judiciária na admissão de demandas provoca excesso de litigiosidade. -

Diagnóstico.

 

A praxe judiciária nos indica um número elevado de processos onde há pedido de gratuidade judiciária.

Realmente, são raros os casos em que não há este pedido.

Neste quadro, importante salientar a uniformidade na avaliação da sua concessão.

O NCPC é claro ao afirmar que basta a simples afirmação de pobreza para comprovar o benefício (artigo 99). Tal disposição materializa a facilitação de vir a juízo na defesa de seus direitos. Seria muito difícil o pobre comprovar tal condição sem um instrumento simples e direto como afirmação.

Contudo, o avanço da tecnologia e o acesso a bancos de dados possibilitam a aferição do preenchimento de seus requisitos.

O STJ já atestou que a afirmação de pobreza goza de presunção relativa de veracidade, cedendo à prova diversa(STJ- 1ª turma, REsp 544.021, rel. Min. Teori Zavascki, j. 21.10.03, negaram provimento).

Da mesma forma, entendeu-se legítima a postura judicial de condicionar o benefício à comprovação em face da atividade exercida pelo interessado ((RMS 1.243/RJ, Rel. Ministro NILSON NAVES, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/05/1992, DJ 22/06/1992, p. 9753).

Lembre-se que há mais de oitenta milhões de processos em tramitação no Brasil1. O processo judicial demanda um custo, suportado pelas partes, através do pagamento da taxa judiciária, mas, em face da gratuidade judiciária, é arcado por todos. Igualmente, um controle efetivo da gratuidade judiciária pode implicar na efetiva redução de demandas. Ora, a partir do momento que as partes entendam que não há como litigar sem consequências, haverá uma meditação em provocar o Judiciário com uma demanda sem nenhum cabimento, ou somente pedir o plausível.

Não falo aqui de direitos constitucionais, mas sim de direitos processuais judiciais. O problema não é o direito "que tem que existir" o problema é a falta de dever e responsabilidade. É evidente que as portas do Judiciário e da Justiça devem ser abertas para todo o cidadão, mas ao mesmo tempo o cidadão deve responder pelos seus atos.

O problema do sistema de Justiça é que ele é um sistema em que o cidadão, em geral, principalmente o cidadão menos abastado, não tem ônus de entrar com um processo judicial. Ele tem o direito mas, se ele perder, ele não é onerado de forma alguma.

Isso cria uma cultura de falta de responsabilidade. Então este cidadão não vê problema em ficar entupindo o Judiciário de ações temerárias. Ações que não vão levar a canto nenhum, ações que não se justificam na prática, porque aquilo não tem consequência absolutamente nenhuma para ele.

E mais: não é só o cidadão. É o advogado também. Isso é unir a fome com a vontade de comer. Não existe responsabilidade do cidadão, não existe responsabilidade para o advogado, e para o advogado, tudo o que ele ganhar, ao final, é lucro. Cria-se, no final das contas, um sistema que ele tem justos direitos, porém nenhuma responsabilidade. E o resultado é: 80 milhões de processos.2 Um bom exemplo disso foi a reforma trabalhista realizada em 2017. Ela reduziu o amplo espectro de pedidos, diminuindo a complexidade de demandas, ao mesmo tempo em que reduziu a quantidade de novos processos ajuizados.

"Segundo a Coordenadoria de Estatística do TST, entre janeiro e setembro de 2017, as Varas do Trabalho receberam 2.013.241 reclamações trabalhistas. No mesmo período de 2018, o número caiu para 1.287.208 reclamações trabalhistas." 3

Esta reforma trabalhista estabeleceu critérios, legais, na concessão da gratuidade judiciária.

"Art. 790. .............................................................

.....................................................................................

§ 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

§ 4o O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo." (NR)4

Assim, presume-se pobre quem detiver a renda inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do RGPS, sem prejuízo, evidentemente, que comprove despesas que o impossibilitem pagar os ônus processuais. A interpretação dos artigos nos permite avaliar que, em regra, teríamos um piso de R$ 2.258,00, o qual, se ultrapassado, atribui ônus ao requerente de demonstrar que não pode se sustentar. Neste ponto, o DIEESE afirma que a quantia de R$3.990,005 é suficiente para sustentar uma família de quatro pessoas.

Ainda, um número infindável de feitos que não se enquadrem no conceito de pobre termina prejudicando quem realmente é hipossuficiente. É fato público e notório que a Justiça Federal sofreu com a possibilidade de não dispor de recurso orçamentário para arcar com os honorários periciais no ano de 2018. Num cenário orçamentário adverso, o adequado enquadramento do que seja assistência gratuita ganha relevo, direcionando a verba orçamentária a quem mais carece. Neste cenário, emerge a necessidade de os juízos analisarem com rigor os pedidos de gratuidade formulados, subsidiando-os com a juntada de documentos disponíveis em bancos de dados públicos ou concitando às partes a fazê-lo.

Por outro lado, a prática judiciária nos revela que inúmeras análises da gratuidade judiciária não tem um norte, seja deferindo, seja indeferindo tais pedidos

A vantagem de tal providência é, dentro da boa prática procedimental, afastar, imediatamente, isenções de custas descabidas, ao mesmo tempo em que se possibilita às partes não enveredarem por verdadeiras aventuras jurídicas sem lhe atribuir ônus nem surpresas ao final.

Acrescente-se a sobrecarga da análise de feitos pelo TRF-3 dos pedidos de reforma de decisões que indeferem a gratuidade.

Lançando os termos "justiça gratuita" e "agravo de instrumento" na consulta de jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, produz-se uma pesquisa que nos remete a 2732 documentos.

A possibilidade de uniformizar tal entendimento no âmbito do Tribunal agilizaria o julgamento da matéria.

Em breve pesquisa, encontramos precedentes que afastaram a adoção de um critério legal na aferição da gratuidade: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. ALEGAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. 1 - O Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) passou a dispor sobre a assistência judiciária gratuita, revogando em parte a Lei nº 1.060/50. 2 - Com a vigência da nova lei processual, a declaração do postulante quanto à insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios faz-se por meio de pedido formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. 3 - Restou mantida a presunção de veracidade da afirmação da parte quanto a sua hipossuficiência financeira, prevista anteriormente no artigo 4º, da Lei nº 1.060/50, revogado pelo artigo 99, §3º, do CPC/2015. 4 - No caso concreto, o indeferimento da gratuidade da justiça deveu-se exclusivamente ao fato de a renda mensal comprovada pelo requerente (cerca de dois mil reais) ser superior ao limite de isenção para fins de imposto de renda. No entanto, se nossa lei processual não estabeleceu um critério objetivo de renda máxima para a aferição da hipossuficiência não cabe ao Judiciário fazê-lo, porque estaria invadindo atribuição reservada ao legislador. Demais disso, não é mesmo possível considerar apenas a renda bruta do jurisdicionado para aferir a sua situação econômica, sem levar em conta, por exemplo, o contexto pessoal e familiar em que está inserido e a eventual existência de despesas extraordinárias, tão comuns na terceira idade. 5 - Não estando presentes nos autos, portanto, elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, deve prevalecer a presunção de verdadeira da afirmação de insuficiência do autor, nos precisos termos dos parágrafos 2º e 3º do art. 99 do CPC/2015. 6 - Agravo de instrumento provido. (TRF 3ª Região, 3ª Seção, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5000248-60.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 16/05/2017, Intimação via sistema DATA: 19/05/2017). (sem destaques no original). Igualmente, mencionemos AI- 5015925-96.2018.4.03.0000, AI/SP 5015925-96.2018.4.03.0000, AI-/SP 5014886-64.2018.4.03.0000.

O Tribunal, por outro lado, já adotou em outros julgados um critério objetivo na aferição do que seja marcadamente pobre. Citemos: AI/SP 010845-54.2018.4.03.0000, AI/SP 5021858-84.2017.4.03.0000.

Assim, nesse particular, emerge a necessidade de a matéria ser disciplinada pelo colendo TRF-3, por meio da deflagração de IRDR(incidente de resolução de demandas repetitivas) para imprimir segurança jurídica e isonomia na aplicação de um critério objetivo, como o instituído na reforma trabalhista na aferição da assistência judiciária gratuita e na coleta pelos magistrados na admissão da demanda do requisito miserabilidade das partes.

Veja-se que a questão se repercute em diversos processos e sua disciplina pelo TRF-3 proporcionará um tratamento linear no âmbito do Tribunal, exatidão e igualdade da matéria processual em apreço.

Ainda, a solução deste incidente, nos termos do artigo 932 do CPC proporcionará o julgamento monocrático do relator nos agravos de instrumento propostos, desafogando a pauta de julgamento do Tribunal. Portanto, à vista do problema narrado, propomos as seguintes soluções:

1- Solicitação à Corregedoria Regional do TRF-3 para que esta recomende, dentro da independência funcional, como boa prática cartorária, a edição de portaria pelos Magistrados, determinando que as serventias judiciais, havendo pedido de justiça gratuita, anexem extratos dos bancos de dados disponíveis (CNIS e portal da transparência) quanto à remuneração das partes.

2- Solicitação à diretoria do foro para que esta encaminhe aos dignos magistrados desta seção judiciária, alertando da necessidade de rigoroso controle da análise dos pedidos de gratuidade judiciária.

3- Solicitação à diretoria do foro para que esta dê ciência da presente aos excelentíssimos magistrados, para, se assim entenderem, suscitem nos processos de sua competência, Instituto de Resolução de demandas Repetitivas junto ao TRF-3;

4- Solicitação à Presidência do TRF-3 para que esta dê ciência da presente aos Excelentíssimos Desembargadores, para, se assim entenderem, suscitem nos processos de sua competência, Instituto de Resolução de demandas Repetitivas para uniformizar a questão.

 

É como voto.

 

Centros de Inteligência da Justiça Federal