Nota Técnica 2 (CLISP)/2018

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11/12/2018

DE JF 3. REGIÃO - ADM,n. 8, p. 14-20.Data de disponibilização: 11/01/2019. Data de publicação: 1º dia útil seguinte ao da disponibilização no Diário eletrônico (Lei 11419/2006)

Aplicação das normas que disciplinam a concessão dos benefícios da justiça gratuita

NOTA TÉCNICA NI CLISP Nº 2/2018 Centro Local de Inteligência da Justiça Federal de São Paulo São Paulo, 11 de dezembro de 2018 Publicação: e-DJ/TRF3R - Publicações Administrativas, Edição n. 8, 11/01/2019, p. 14-20 Assunto: Aplicação das normas que disciplinam a concessão dos benefícios da...
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NOTA TÉCNICA NI CLISP Nº 2/2018

 

Centro Local de Inteligência da Justiça Federal de São Paulo

 

São Paulo, 11 de dezembro de 2018

 

 

Publicação: e-DJ/TRF3R - Publicações Administrativas, Edição n. 8, 11/01/2019, p. 14-20

 

Assunto: Aplicação das normas que disciplinam a concessão dos benefícios da justiça gratuita

 

Relator: Juiz Federal Márcio Ferro Catapani

 

Revisora: Juiza Federal Taís Vargas Ferracini de Campos Gurgel

 

OBJETIVO

 

A presente nota técnica tem por objetivo verificar:

 

i. a necessidade de adoção de práticas para apuração mais precisa e efetiva da presença dos requisitos necessários à concessão dos benefícios da justiça gratuita; e

 

ii. quais são, diante do quadro normativo atual, os requisitos necessários à concessão dos benefícios da justiça gratuita.

 

JUSTIFICATIVA

 

Há dois valores relativamente contrapostos a serem considerados quando se trata de analisar a possibilidade de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.

 

De um lado, a própria Constituição Federal de 1988 garante o amplo acesso à justiça de forma geral e, mais especificamente, determina que "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (art. 5º, LXXIV). Como consequência, na grande maioria dos casos em que é requerido o benefício da gratuidade da justiça, ele é deferido[1].

 

Por outro lado, a quantidade de recursos à disposição para a efetivação dessa garantia constitucional - como de qualquer outro direito, deve-se salientar - é limitada. Não se pode deixar de acrescentar que, no tempo em que vivemos, o próprio reconhecimento da limitação dos recursos estatais assume dimensão constitucional, como bem demonstra a Emenda Constitucional n.º 95.

 

Ademais, não é lícita a renúncia a receitas públicas, exceto nos casos expressamente previstos em lei (Lei Complementar n.º 101/2000, art. 1º, § 1º).

 

Nesse contexto, a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita de modo indiscriminado e sem a real verificação da presença dos requisitos que a ensejam é contrária à ordem jurídica e põe em risco, inclusive, o atendimento àqueles que efetivamente dependem desses benefícios.

 

Não se pode deixar de acrescentar, ainda, que a cobrança de taxa judiciária para a propositura de ações, bem como dos demais consectários normalmente designados como "ônus da sucumbência" e que são diretamente afetados no caso de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, atua também como fator de desestímulo à litigância exagerada e mesmo irresponsável. Nesse contexto, a concessão de modo inadequado dos benefícios ora em discussão também pode atuar como fator de aumento na litigiosidade, em prejuízo a todo o sistema de justiça.

 

Assim, faz-se necessário o estudo aprofundado das questões propostas na presente nota técnica.

 

FUNDAMENTAÇÃO

 

A assistência judiciária gratuita[2] tem o seu fundamento constitucional assim delineado:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos

 

A matéria já vinha regulada, em nível infraconstitucional, pela Lei n.º 1.060/1950, que ainda se encontra parcialmente em vigor. Em especial, transcrevemos os seguintes dispositivos:

 

Art. 1º. Os poderes públicos federal e estadual, independente da colaboração que possam receber dos municípios e da Ordem dos Advogados do Brasil, - OAB, concederão assistência judiciária aos necessitados nos termos da presente Lei. (Redação dada pela Lei nº 7.510, de 1986)

 

Art. 5º. O juiz, se não tiver fundadas razões para indeferir o pedido, deverá julgá-lo de plano, motivando ou não o deferimento dentro do prazo de setenta e duas horas.

 

§ 1º. Deferido o pedido, o juiz determinará que o serviço de assistência judiciária, organizado e mantido pelo Estado, onde houver, indique, no prazo de dois dias úteis o advogado que patrocinará a causa do necessitado.

 

§ 2º. Se no Estado não houver serviço de assistência judiciária, por ele mantido, caberá a indicação à Ordem dos Advogados, por suas Seções Estaduais, ou Subseções Municipais.

 

§ 3º. Nos municípios em que não existirem subseções da Ordem dos Advogados do Brasil. o próprio juiz fará a nomeação do advogado que patrocinará a causa do necessitado.

 

§ 4º. Será preferido para a defesa da causa o advogado que o interessado indicar e que declare aceitar o encargo.

 

§ 5° Nos Estados onde a Assistência Judiciária seja organizada e por eles mantida, o Defensor Público, ou quem exerça cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as Instâncias, contando-se-lhes em dobro todos os prazos. (Incluído pela Lei nº 7.871, de 1989)

 

Art. 8º. Ocorrendo as circunstâncias mencionadas no artigo anterior, poderá o juiz, ex-offício, decretar a revogação dos benefícios, ouvida a parte interessada dentro de quarenta e oito horas improrrogáveis.

 

Art. 9º. Os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo até decisão final do litígio, em todas as instâncias.

 

Art. 10. São individuais e concedidos em cada caso ocorrente os benefícios de assistência judiciária, que se não transmitem ao cessionário de direito e se extinguem pela morte do beneficiário, podendo, entretanto, ser concedidos aos herdeiros que continuarem a demanda e que necessitarem de tais favores, na forma estabelecida nesta Lei.

 

Art. 13. Se o assistido puder atender, em parte, as despesas do processo, o Juiz mandará pagar as custas que serão rateadas entre os que tiverem direito ao seu recebimento.

 

Hoje, a matéria também é disciplinada no Código de Processo Civil, nos seguintes termos:

 

Seção IV

 

Da Gratuidade da Justiça

 

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

 

§ 1º. A gratuidade da justiça compreende:

 

I - as taxas ou as custas judiciais;

II - os selos postais;

III - as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios;

IV - a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse;

V - as despesas com a realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados essenciais;

VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira;

VII - o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução;

VIII - os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório;

IX - os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido.

 

§ 2º. A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência.

 

§ 3º. Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

 

§ 4º. A concessão de gratuidade não afasta o dever de o beneficiário pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas.

 

§ 5º. A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.

 

§ 6º. Conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.

 

§ 7º. Aplica-se o disposto no art. 95, §§ 3º a 5º, ao custeio dos emolumentos previstos no § 1º, inciso IX, do presente artigo, observada a tabela e as condições da lei estadual ou distrital respectiva.

 

§ 8º. Na hipótese do § 1º, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento de que trata o § 6o deste artigo, caso em que o beneficiário será citado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento.

 

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

 

§ 1º. Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.

 

§ 2º. O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

 

§ 3º. Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.

 

§ 4º. A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça.

 

§ 5º. Na hipótese do § 4º, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade.

 

§ 6º. O direito à gratuidade da justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário, salvo requerimento e deferimento expressos.

 

§ 7º. Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento.

 

Art. 100.Deferido o pedido, a parte contrária poderá oferecer impugnação na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso.

 

Parágrafo único. Revogado o benefício, a parte arcará com as despesas processuais que tiver deixado de adiantar e pagará, em caso de má-fé, até o décuplo de seu valor a título de multa, que será revertida em benefício da Fazenda Pública estadual ou federal e poderá ser inscrita em dívida ativa.

 

Art. 101. Contra a decisão que indeferir a gratuidade ou a que acolher pedido de sua revogação caberá agravo de instrumento, exceto quando a questão for resolvida na sentença, contra a qual caberá apelação.

 

§ 1º. O recorrente estará dispensado do recolhimento de custas até decisão do relator sobre a questão, preliminarmente ao julgamento do recurso.

 

§ 2º. Confirmada a denegação ou a revogação da gratuidade, o relator ou o órgão colegiado determinará ao recorrente o recolhimento das custas processuais, no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de não conhecimento do recurso.

 

Art. 102. Sobrevindo o trânsito em julgado de decisão que revoga a gratuidade, a parte deverá efetuar o recolhimento de todas as despesas de cujo adiantamento foi dispensada, inclusive as relativas ao recurso interposto, se houver, no prazo fixado pelo juiz, sem prejuízo de aplicação das sanções previstas em lei.

 

Parágrafo único. Não efetuado o recolhimento, o processo será extinto sem resolução de mérito, tratando-se do autor, e, nos demais casos, não poderá ser deferida a realização de nenhum ato ou diligência requerida pela parte enquanto não efetuado o depósito.

 

Assim, em resumo, o processamento do pedido de concessão da gratuidade dá-se da seguinte forma:

 

i. o requerente apresenta o pedido no momento processual oportuno (petição inicial, contestação, petição para ingresso de terceiro no processo, recurso, ou, se a causa for superveniente, a qualquer momento);

 

ii. o juiz defere de plano o pedido ou determina à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos;

 

iii. caso comprovados os pressupostos, o juiz defere o pedido. Se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, ele deve ser indeferido;

 

iv. uma vez deferido o pedido, a parte contrária pode se opor à concessão da gratuidade. Em obediência ao contraditório, o beneficiário será ouvido e o juiz decidirá a matéria.

 

Além disso, o Código prevê expressamente que "presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural". Com efeito, a praxe judiciária anterior ao Código já havia se consolidado com a exigência da chamada "declaração de hipossuficiência", documento assinado pela parte em que declara expressamente que não possui condições de arcar com as custas e despesas processuais sem prejuízo de seu sustento e de sua família.

 

No entanto, a jurisprudência sempre entendeu que essa presunção é relativa, ou seja, admite prova em contrário (vide, v.g., AgInt no RMS 55.042/PA, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª Turma, julgado em 20/09/2018, DJe 26/09/2018). Aliás, o caráter relativo da presunção constava expressamente do já mencionado art. 4º, § 1º, da Lei n.º 1.060/1950, segundo o qual "presume-se pobre, até prova em contrário, quem afirmar essa condição nos termos desta lei". Ainda que o Código vigente não tenha sido expresso quanto a essa questão, a possibilidade de indeferimento do pedido e de contraposição pela parte contrária permitem concluir que a sistemática não se alterou.

 

Tendo em vista essa presunção - que já constava do art. 4º, § 1º, da Lei n.º 1.060/1950, na redação dada pela Lei n.º 7.510/1986, é relativamente comum que, ante a mera juntada da declaração de hipossuficiência, os benefícios da justiça gratuita sejam imediatamente concedidos ao requerente, sem qualquer exigência de demonstração ou justificativa.

 

Em que pese a letra da lei autorizar essa conclusão, existem medidas relativamente simples que podem ser efetuadas pelo Poder Judiciário.

 

Uma medida bastante eficiente é a consulta ao CNIS[3], para verificação da existência de vínculo empregatício atual do requerente e, em caso positivo, o valor do salário ou proventos percebidos. Essa providência pode ser realizada de ofício pelo próprio juízo e não demanda qualquer ato processual para tanto. Caso os dados obtidos no CNIS sejam suficientes à concessão do benefício, a discussão encerra-se prontamente. Caso os dados não permitam essa conclusão, pode-se intimar o requerente para apresentar elementos que comprovem a insuficiência de recursos.

 

Além disso, caso a qualificação do requerente indique uma alta probabilidade de que ele possa arcar com as custas e despesas processuais - como ocorre com os empresários e profissionais liberais, como advogados, médicos, engenheiros, arquitetos etc., que muitas vezes não percebem salário em sentido técnico e cujos dados constantes do CNIS sejam imprecisos ou insuficientes - o ideal é que, antes da concessão do benefício, a parte seja intimada a comprovar sua renda e a necessidade da concessão do benefício.

 

Deve-se, contudo, salientar que essas medidas possuem caráter jurisdicional e não podem ser impostas aos juízes por este Centro de Inteligência.  Assim, sugere-se que a Administração tome as medidas necessárias para dar amplo conhecimento e fomentar o debate acerca da matéria, conscientizando os juízes acerca da necessidade de maior atenção quanto ao tema. Nas Varas e Juizados Especiais em que há secretaria unificada, o juiz coordenador ou presidente poderá tomar as providências necessárias para que as medidas ora sugeridas sejam adotadas como rotina padrão.

 

Resta, ainda, outra questão a ser analisada, para que se possa realizar uma análise completa da matéria: quais são, diante do quadro normativo atual, os requisitos necessários à concessão dos benefícios da justiça gratuita.

 

Da análise das decisões dos juízes federais, pode-se verificar a adoção dos seguintes critérios:

 

i. o meramente casuístico, ou seja, a verificação dos elementos fáticos de cada caso isoladamente considerado;

 

ii. o limite de isenção do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza para pessoas físicas, que atualmente é de R$ 1.903,98 mensais (Lei n.º 11.482/2007, art. 1º, IX, com a redação dada pela Lei n.º 13.149/2015);

 

iii. o limite de renda fixado pela Defensoria Pública da União para presunção de necessidade econômica, de R$ 2.000,00 (Resolução n.º 134/2016 do Conselho Superior da Defensoria Pública da União); e

 

iv. o limite estabelecido para a concessão da justiça gratuita pelo art. 790, § 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho, com a redação dada pela Lei n.º 13.467/2017, que é de 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

 

No que tange ao último critério, vale transcrever os seguintes dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho:

 

Art. 790. Nas Varas do Trabalho, nos Juízos de Direito, nos Tribunais e no Tribunal Superior do Trabalho, a forma de pagamento das custas e

emolumentos obedecerá às instruções que serão expedidas pelo Tribunal Superior do Trabalho.

(...)

§ 3º. É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de

ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40%

(quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.(Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 4º. O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.

(Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)

 

A jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça havia se firmada contrariamente aos critérios mencionados no item (ii) acima, pois levava em consideração parâmetros exclusivamente objetivos que não tinham previsão legal. Nesse sentido, veja-se o seguinte julgado:

 

PROCESSUAL CIVIL. JUSTIÇA GRATUITA. IMPOSTO DE RENDA. FAIXAS DE RENDIMENTOS. CRITÉRIO ABSTRATO.

INADMISSIBILIDADE. 1. É assente na jurisprudência do STJ que a simples declaração de hipossuficiência da pessoa natural, ainda que dotada de presunção iuris tantum, é suficiente ao deferimento do pedido de gratuidade de justiça quando não ilidida por outros elementos dos autos.

2. Esta Corte Superior rechaça a adoção única de critérios abstratos, como a faixa de isenção do imposto de renda, uma vez que eles não representam fundadas razões para denegação da justiça gratuita.

3. Agravo interno desprovido.

(AgInt no REsp 1372128/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 26/02/2018)

 

Com efeito, essa Corte Superior tem rejeitado critérios puramente objetivos não previstos em lei, in verbis:

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. O PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA DEVE SER ANALISADO COM BASE NOS ELEMENTOS CONCRETOS EXISTENTES NOS AUTOS. NÃO É POSSÍVEL A FIXAÇÃO DE CRITÉRIOS ALEATÓRIOS, NÃO PREVISTOS EM LEI. AGRAVO REGIMENTAL DOS SERVIDORES A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não encontra amparo legal o critério adotado pelo Tribunal de origem para a

concessão da gratuidade judiciária, qual seja, a renda mensal inferior a 10 salários mínimos. Precedentes: AgInt no AgInt no AREsp. 868.772/SP,

Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 26.9.2016; EDcl no AgRg no AREsp. 753.672/RS, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJe 29.3.2016;

AgRg no REsp. 1.403.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 6.12.2013.

2. Nestes termos, impõe-se o retorno dos autos à origem para a apreciação do pedido de assistência judiciária gratuita, com base nos elementos

concretos existentes nos autos.

3. Agravo Regimental dos Servidores a que se nega provimento.

(AgRg no AgRg no REsp 1402867/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/02/2018, DJe

14/03/2018)

 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. LEI N. 1.060/1950.

ADOÇÃO DE CRITÉRIO NÃO PREVISTO EM LEI. CRITÉRIO OBJETIVO DE RENDA INFERIOR A 10 SALÁRIOS MÍNIMOS.

INADMISSIBILIDADE. NECESSIDADE DE ANÁLISE DO CASO CONCRETO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM.

1. O Superior Tribunal de Justiça fixou a orientação jurisprudencial de que "a decisão sobre a concessão da assistência judiciária gratuita amparada em critérios distintos daqueles expressamente previstos na legislação de regência, tal como ocorreu no caso (renda do autor), importa a violação aos dispositivos da Lei n. 1.060/1950, que determinam a avaliação concreta sobre a situação econômica da parte interessada com o objetivo de verificar a sua real possibilidade de arcar com as despesas do processo, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família" (AgInt no AgInt no AREsp 868.772/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 26/9/2016).

2. Concluiu a Corte de origem que o recorrente percebe remuneração superior ao parâmetro objetivo utilizado por aquele órgão colegiado para aferir-se o deferimento dos benefícios da justiça gratuita. Todavia, este Tribunal pacificou o entendimento de que, para desconstituir a presunção estabelecida pela lei, há necessidade de perquirir, concretamente, a situação financeira atual do requerente, o que não foi observado no caso.

3. Recurso especial provido. (REsp 1706497/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/02/2018, DJe 16/02/2018)

 

Assim, pode-se concluir que também o critério mencionado no item (iii) demonstra-se contrário à jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça.

 

Por outro lado, parece-nos que a verificação exclusivamente casuística da necessidade esbarra em dois inconvenientes. O primeiro é o afastamento de uma atuação isonômica, pois dificilmente haverá um padrão de comparação. O segundo é a insegurança gerada, inclusive às partes, que nunca poderão saber de antemão se o benefício será ou não concedido.

 

O quarto critério - previsto na Consolidação das Leis do Trabalho - ainda não foi apreciado pelo E. Superior Tribunal de Justiça. A sistemática própria do processo trabalhista poderia ser aplicada ao processo civil por analogia, afastando-se assim o óbice da inexistência de previsão legal.

 

Com efeito, os §§ 3º e 4º do art. 790 da Consolidação tratam especificamente da gratuidade da justiça. Além disso, a interpretação sistemática desses dispositivos afasta o empecilho do caráter puramente objetivo: haveria a presunção de hipossuficiência para aqueles que recebem até 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, sendo que os demais casos dependeriam de prova.

 

Para tornar a matéria mais segura e pacífica, o ideal é que o E. Superior Tribunal de Justiça se pronunciasse acerca da aplicabilidade da sistemática prevista nos §§ 3º e 4º do art. 790 da Consolidação das Leis do Trabalho ao processo civil.

 

ENCAMINHAMENTOS SUGERIDOS

 

Diante do exposto, sugere-se o encaminhamento da presente nota técnica:

 

i. à Diretoria do Foro, para que tome as medidas necessárias para divulgar a presente nota, fomentar o debate acerca conscientizar os juízes acerca da necessidade de maior atenção quando da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, inclusive por meio da consulta de ofício ao CNIS ou intimação da parte para apresentar documentos. A ampla divulgação pode ser efetuada com o auxílio do Centro de Inteligência;

 

ii. aos juízes coordenadores ou presidentes de Varas e Juizados Especiais em que há secretaria unificada, com a sugestão de que levem o tema para discussão com os colegas, a vim de verificar a pertinência de tomar as providências necessárias para que as medidas ora sugeridas sejam adotadas como rotina padrão;

 

iii. ao Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal, para que verifique a pertinência de apresentar a matéria à Comissão Gestora de Precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça, com vistas à análise da aplicabilidade da sistemática prevista nos §§ 3º e 4º do art. 790 da Consolidação das Leis do Trabalho ao processo civil.

 

Por fim, deve-se notar que a questão referente à gratuidade da justiça está intimamente ligada à da competência dos Juizados Especiais Federais, em especial no que tange à adoção e cumprimento de critérios adequados para fixação do valor da causa, uma vez que há significativas diferenças entre os custos do processo no sistema dos Juizados e naquele das Varas. Consequentemente, sugere-se a realização de novos estudos, por este Centro Local de Inteligência, acerca das medidas que podem ser adotadas para uma melhor e mais precisa aferição do valor da causa.

 

Além disso, como forma de execução e implementação das medidas propostas na presente nota técnica, sugere-se a criação de projeto-piloto, com a adesão de ao menos 3 Varas com competência previdenciária ou Juizados Especiais Federais. A partir da adoção das medidas, sugere-se que seja feito, ao menos trimestralmente, o levantamento de dados nessas Varas ou Juizados, para acompanhar os efeitos produzidos.

 

[1] Os dados acerca dessa questão, ao menos no âmbito da Justiça Federal da 3ª Região, não são completos, na medida em que os sistemas processuais, na maioria das vezes, não são alimentados com esse tipo de informação, apesar da existência de rotinas específicas para tanto. De qualquer modo, levantamento realizado pelo NUAJ em 09/11/2018, demonstra a existência de 5.083 processos físicos em que a matéria foi decida e os dados foram inseridos no sistema respectivo. Desses, a gratuidade foi deferida em 4.935 dos casos (97,09%), sendo indeferida em apenas 148 (2,91%). Ainda não foi possível obter os dados do PJe sobre a matéria.

 

[2] Além da assistência judiciária gratuita, há outros institutos e disposições que afetam diretamente a cobrança de custas e os ônus da sucumbência. Entre eles, deve-se citar o art. 129, paragrafo único, da Lei n.º 8.213/1991, segundo o qual, nos "litígios e medidas cautelares relativos a acidentes do trabalho", há isenção "do pagamento de quaisquer custas e de verbas relativas à sucumbência". Essa norma específica, contudo, possui pouco impacto no âmbito da Justiça Federal, na medida em que os benefícios acidentários estão excluídos de sua competência, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal de 1988.

 

[3] Ressalte-se que, nos termos do acordo celebrado entre o CJF e o INSS, a utilização do CNIS é limitada às ações de natureza previdenciária. Assim, essa consulta seria possível, ao menos à primeira vista, apenas em feitos dessa natureza.

 

 

Documento assinado eletronicamente por Marcio Ferro Catapani, Juiz Federal Relator, em 07/01/2019, às 19:19, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. Documento assinado eletronicamente por Tais Vargas Ferracini de Campos Gurgel, Juíza Federal Revisora, em 09/01/2019, às 13:54, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.

 

Documento assinado eletronicamente por Katia Herminia Martins Lazarano Roncada, Juíza Federal Presidente do Centro Local de

Inteligência da Seção Judiciária de São Paulo, em 10/01/2019, às 08:15, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.

 

Este texto não substitui o publicado no Diário Eletrônico

 

Centros de Inteligência da Justiça Federal